quinta-feira, 15 de julho de 2021

VOU ALI E JÁ VENHO

 



Vou ali e já venho

Tudo pelo melhor


eufrázio filipe

quarta-feira, 30 de junho de 2021

À FLOR DA PELE

 



Os teus olhos pássaros

espantados

dedilham um rio

à flor da pele


eufrázio filipe


sábado, 19 de junho de 2021

A NOSSA ROMÃ

 


Nesta ilha de jangadas imperfeitas, as romãs abriam os  lábios,
explodiam multidões.
Os cães adivinhavam o brilho dos relâmpagos e tu caías abrupta
nos meus braços.
Quando te ouvi assim a cair dos céus, desamparada a lubrificar a terra,
não sabia o teu nome, muito menos como te beijar os pés.
Quando te vi assim pendente, incolor, nua de tudo, chamei-te chuva,
um qualquer nome - e tu chegaste a cântaros, tão líquida por entre os meus dedos.
Recebi-te quase ninfa , de braços abertos na minha escarpa e assim ficámos
vagarosos instantes a respirar eternidades.
Ainda hoje não sei quem és senhora.
Trazias nos cabelos um mar desgrenhado a derramar estrelas, um cântico 
sibilino, barcos do outro lado do cais.
Escancarei as janelas, acendi um fósforo no alpendre da casa, e tu lá estavas
sem muros nem amos, a cantar.
Se tivesse que te desenhar faria um gesto, um risco a carvão no ar
que respiramos, bebia-te às mãos cheias,
mas deixaria na tua árvore preferida - uma romã.


Eufrázio Filipe

sexta-feira, 4 de junho de 2021

OS TEUS PÉS

 




Passo a passo
a desbravar caminhos
na vertigem das marés

andas desandas tropeças
constróis pontes
precárias definições

passo a passo
até acontecer uma pedra
com vida por dentro

Sabes que não existem pedras
com vida por dentro
mas continuam a andar
os teus pés

passo a passo
a cumprir este chão


eufrázio filipe

quarta-feira, 26 de maio de 2021

MAREANTES DO VENTO

 



Crescemos na nudez das pedras

crescemos e desmaiamos
conforme as marés

vertemo-nos líquidos
em caudais de sons
ardidos no sal
no delírio da espuma
por todo o corpo

crescemos na substância das pedras
com asas muito leves

não somos barcos de carregar velas

somos mareantes do vento


eufrázio filipe
(revisitado)


quinta-feira, 13 de maio de 2021

O ADMIRÁVEL GRÃO DE AREIA

 



Correm em bando os teus olhos
por cima das searas e dos ventos
porque é preciso transgredir
rasgar o véu que se demora em fascínios

encontrar no corpo interior
um sinal primitivo de nudez
uma pequena distração de flor
que agite o ambíguo coração dos  pássaros
e abra novos caminhos
por esse mundo 
onde todos os rios
deviam ser apenas água

provavelmente só nos teus olhos
há um brilho indígena em gestação

Eis a nova ordem emergente
a gota de orvalho que funde a luz

o admirável grão de areia
que não repousa


Eufrázio Filipe


quarta-feira, 5 de maio de 2021

VERDADES IMPROVÁVEIS (2)

 



Na ausência de palavras
desenhei uma flor encarnada
neste chão de marés

soltei-lhe as pétalas

cadenciadas
silvestres
musicais

agarrei o vento pelas crinas
esculpi 
um grão de areia
para a vida despontar
num sopro
e a luz se libertar
pelas fissuras das pedras

convoquei pássaros
e outros silêncios

escrevi de novo
verdades improváveis

Inesperadamente
hoje não quis salvar o mundo


Eufrázio Filipe


quinta-feira, 29 de abril de 2021

ESTÁTUA NO EXÍLIO

 



Sereníssima
oriunda dos melhores gestos
aos meus olhos
supera o criador

traz na voz
uma feira de barro
inscreve nas linhas
da palma das mãos
contornos de luz

celebra o efémero
no mais íntimo dos espelhos

Musa purificada de palavras
estátua no exílio


eufrázio filipe
(Chão de Marés)


quarta-feira, 21 de abril de 2021

MADRUGADA EM FLOR




Na incandescência
dos nossos lábios
arde em flor a madrugada
tangem cordas de oiro e prata
os nossos dedos

espargimos o sussurro
dos cravos
caminhos cingidos
na voz

passo a passo
saltam faúlhas
que nos alimentam

até arder de novo
 madrugada


eufrázio filipe

quarta-feira, 14 de abril de 2021

NO SENTIDO DO VOO

 


O mar sangrava espumas brancas

lenços de linho

nas ruas deste chão


Eu sabia que serenamente

no fim da Primavera

serias a última a partir


só não sabia que eras tu


Ainda desenhaste um círculo

para eu traduzir o teu rumo


Corri no sentido do voo

um breve acenar


Regressei à casa vazia

pelo trilho do vento

muito antes da luz

se afogar em palavras


eufrázio filipe



domingo, 4 de abril de 2021

QUE FARÁS PELAS NOSSAS FLORES

 


        

As árvores viajam

na sombra do verde

um sussurro de folhas

e tu foges dos ramos


amanheces tão distante

que nem os meus olhos

descobrem os teus gestos


As árvores viajam

onde acontece a cor do fruto

no chão

e os pássaros sem amos

deixam que a sombra

se rebente


Que farás pelas nossas flores?


eufrázio filipe


quinta-feira, 25 de março de 2021

PRIMAVERAS

 

Abri janelas fechei portões

soltei os cães

mas lá no fundo

onde medra a oliveira

vi claramente despontar

não sei o quê

como se as palavras

fossem perfumes de cores

em desordem

no chão que pisamos


Abri janelas para ouvir

o sussurro das águas

num sopro de vento


Não sabia

que te chamavam Primavera


Eufrázio Filipe


quarta-feira, 17 de março de 2021

GORJEIAM PALAVRAS

 

No sulco das águas

onde partilhas

indizíveis silêncios

medram flores

gorjeiam palavras

as mais íntimas

que só dirás aos pássaros


eufrázio filipe



quarta-feira, 10 de março de 2021

ONDE VIAJO

 


Há um sulco invisível

nas águas

onde vijo

me transformo

e nos desprende


eufrázio filipe



sábado, 6 de março de 2021

PARTIDO COM MEMÓRIAS E AMANHÃS

 


1OO gloriosos anos de árdua luta democrática. Gerações de trabalho 

honestidade e competência. Uma longa vida dedicada aos " filhos dos 

homens que nunca foram meninos " 

Um Partido com memórias e amanhãs.



quarta-feira, 3 de março de 2021

ASAS REMOS E PASSOS

 

Na fímbria do mar

flores de sal

agasalham o pão

na tua boca


Neste espaço íngreme

onde te agitas

que bom este cansaço

de asas remos e passos


eufrázio filipe


quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

ESPAÇO PARA CANTAR



Nesta aldeia
de mares imperecíveis
íntegro um pássaro
entendeu
atiçar o fulgor dos timbres
regressar ao cais
soltar os barcos
e partir
nas cordas vocais
de uma guitarra

Nesta aldeia
refúgio
à flor das águas

há espaço para cantar



eufrázio filipe


quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

A NOSSA ROMÃ

 

Nesta ilha de náufragos e jangadas imperfeitas 
as romãs abriam os lábios explodiam multidões.
Os cães adivinhavam o brilho dos relâmpagos e tu caías abrupta nos meus braços. 

Quando te vi assim a cair dos céus, desamparada a lubrificar a terra, não sabia o teu nome,
muito menos como te beijar os pés.
Quando te vi assim pendente, incolor, nua de tudo, chamei-te um nome qualquer  
e tu chegaste a cântaros, tão líquida por entre os meus dedos.

Recebi-te quase ninfa de braços abertos na minha escarpa e assim ficámos vagarosos instantes, 
a respirar eternidades.

Ainda hoje não sei quem és senhora.

Trazias nos cabelos um mar a derramar estrelas, cânticos sibilinos, barcos do outro lado do cais.

Fiquei sem saber se existias de facto ou teria sido eu a inventar-te


Escancarei as janelas, acendi um fósforo no alpendre da casa, e tu lá estavas a cair dos céus, 
sem muros nem amos a cantar. 
Tinhas uma vontade serena de liberdade, uma biblioteca onde se destacavam textos apócrifos, 
mas também vivificavam  ´Jorge Amado e Soeiro Pereira Gomes.

Se tivesse que te desenhar faria um gesto, um risco a carvão no ar que respiramos.
Bebia-te às mãos cheias, mas deixaria na nossa árvore preferida - uma romã.



Eufrázio Filipe
Texto reconstru'ido




segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

TU CANTAS

 



Entre oliveiras buganvílias
e latidos de cães
resiste um poço
a céu aberto
onde temos por hábito
falar baixinho
para não acordar silêncios

No fundo do poço
há um espelho vertiginoso
luz que assoma
aos nossos olhos escarpados

Quando chove a cântaros
tudo fica mais claro
a fluir
na solidão das estrelas

No fundo do poço
não há espaço para cantar
mas tu cantas


eufrázio filipe


domingo, 31 de janeiro de 2021

SOMBRA DE LUZ

 

                                                               Magritte


Quando despertei
para a árvore
que ajudei a plantar

nos espelhos da memória
chovia uma sombra de luz

desejos paisagens sons

e foi assim
neste equilíbrio 
fugaz de assimetrias
que inscrevi no tempo que faz
um espaço
para agitar o vento

mares salivas flores de sal

e foi assim
a prumo nos mastros
em desassossego de barcos
que organizámos jardins
bandos de pássaros
relâmpagos

quando despertei
vesti o melhor fato
só para te ver

e tu lá estavas


eufrázio filipe

quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

HAJA LUZ NO DESCONFINAMENTO


 


Os desesperados das direitas políticas mais alguns tresmalhados
alimentaram o intragável Ventura  ... e se fosse um símio ... teria a mesma votação. 
Trata-se de um fenómeno não original que ofende o regime 
e exige um combate partilhado e lúcido dos democratas em torno das questões fundamentais.

O coiso não deve ser ignorado, muito menos os que mesmo não o apoiando
nele votaram como protesto desgraçado 
Não basta ter razão no combate a todos os vírus.

Haja luz no desconfinamento.


Eufrázio Filipe

sábado, 16 de janeiro de 2021

INCÊNDIO DE CRISÁLIDAS

 




A prumo neste clamor de socalcos  
passo a passo
temos todo o tempo
em pleno voo
sem mapas nem destinos
para nos perder e encontrar

Quando te penso Abril
não estou a carpir lágrimas

festejo os olhos dos pássaros
o sussurro dos mares

solto barcos
sopro faúlhas

vejo-te em flor
num incêndio de crisálidas
asas abertas
a refulgir madrugadas



eufrázio filipe

( Chão de Marés)


quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

AS ÁGUAS SE FAZEM AO MAR

 





Num encontro de gerações
sem verdades absolutas
mas fortes convicções
as águas 
se fazem ao mar

lá estaremos a sulcar
memórias e amanhãs


eufrázio filipe