terça-feira, 27 de maio de 2014

SÓ NOS FALTAVA SEDUZIR OS PÁSSAROS






A remoinhar
no mais íntimo da pele
tínhamos quase tudo
tão perto das mãos
que nem lhe podíamos tocar

amanhãs
e outros destinos

Só nos faltava
subir às pedras deste chão

impedir nas mansas águas
que o sonho rebentasse
onde as estrelas vicejam
sem quebrantos

Tínhamos quase tudo

até um pomar de faúlhas
para alumiar o fulgor do canto

Só nos faltava
seduzir os pássaros


 

domingo, 25 de maio de 2014

VENCEU A ESMAGADORA MINORIA





Em "liberdade" a colossal abstenção
de novo veio à tona nesta europa à margem dos cidadãos.

Agora a magra fatia do bolo será dividida
democrática  mente.
"Esta união europeia" caminha no sentido da "destruição da europa"

Venceu a esmagadora minoria


 

terça-feira, 20 de maio de 2014

PRESOS A UM SOPRO DE VENTO (2)







Trazias desgrenhado
um aroma silvestre

quase divina
a fingir de pássaro
dardejaste na escarpa
uma pátria em cada mão

Belíssimo
matutino o sol
nasceu mais cedo
muito antes de morrer
nos nossos lábios

e assim salvámos
por um instante
a eternidade

presos a um sopro de vento


 

quinta-feira, 15 de maio de 2014

sábado, 10 de maio de 2014

MARINHAS VALENTES


                                                                                                  "Caçador de relâmpagos" 2010


No chão dos marnotos caminhamos azinhagas, comemos amoras, tropeçamos memórias, pedras, pérolas e pó - para compreendermos melhor as palavras de carne e osso  até as metáforas se ajoelharem como pequenos deuses inúteis, à nossa mesa. 

Só depois provamos o sal das marinhas. A safra.
O tempo dos homens que chafurdam no moliço. 
A distância que nos separa e atrai, a pele esfarrapada para resistir aos Invernos, mastros de flores salgadas nos olhos distantes a gatinharem no tempo, até ao aborrecimento final. 

Após a "bobadela" a marinha começa a parir uma massa branca, que envaidece os homens quando se olham nas sombras curvas projectadas nas águas. 

O sal aparece ao ar livre. Reunido em montículos junto aos tabuleiros das marinhas e aí fica a escorrer lágrimas . 

Depois é o marnoto que enche canastras transportadas à cabeça dos moços Depois é sempre assim. O mesmo peso até estar construído o grande cone branco. 

Antes de regressarmos às azinhagas e comermos o resto das amoras, os homens reúnem-se ao cair da noite, para festejar. 

Enquanto se embebedam , cantam com a ajuda de uma gaita de beiços. Há sempre um que vomita e volta a cantar. 
São os rudes corações de oiro, meninos triturados, construtores de marinhas valentes. São os que transformam água em pão, enquanto à nossa mesa se ajoelham as metáforas. 

  
 

segunda-feira, 5 de maio de 2014

A DUNA SOU EU




                                                          " Caçador de relâmpagos " (2010)


Enquanto aquele anjo permanecer nas areias, bem pode o vento soprar.

-  o cão ou o velho?

Lentos , trôpegos, com os pés a tracejarem os caminhos de sempre, todos os dias aquelas almas percorriam memórias.

O cão - mais velho que o dono - era o guia, a sua bengala de cego.
Pela orla da praia, desde a gruta onde viviam até à colossal duna, abrupta sobre as águas, as aves marinhas mergulhavam a pique , esbracejavam só para os salpicar. Lá iam, serenos, livres, sem palavras - imensos.
No ar, o sussurro dos silêncios embalava-lhes os passos num concerto de maresias.
Chegados ao topo da montanha era sempre assim - o velho afagava as orelhas do cão e o cão lambia-lhe as mãos.
Sentados - respiravam infinitos - o perfume das algas - adormeciam no tempo.

Ao longe, muito ao longe, alguém de um barco bramou :
- fuja, a duna vai desmoronar-se.

Imperturbável, respondeu baixinho para não acordar o cão :

- A duna sou eu.