quarta-feira, 30 de dezembro de 2009
O PÓ DO TEMPO
Inesperadamente acordei
Coloquei o teu travesseiro no meu travesseiro
liguei o rádio
fumei um cigarro
abri a porta do relógio de pêndulo
para dar corda ao tempo
e ver-te passar
Soprei os ponteiros e voaste
tão longe
que só um dia te encontrei
na areia da praia
a olhar um barco
que nunca existiu
a não ser quando um pássaro distraído
em confluência de rotas
tranportou o vento nas asas
e pousou em silêncio
no teu olhar
Lembras-te?
Lembro.
Na rebentação das marés
onde se enleiam sargaços
começámos a soletrar pelos dedos
palavras excessivas belas imensas
a erguer das cinzas
o pó do tempo
domingo, 27 de dezembro de 2009
QUE OUTRO MAR EU NÃO SEI?
Subi ao que pensei ser
o mastro mais alto da vida
só para te ver
onde sei
que o mar faz os seus ninhos
Foi lá que lançaste um grito
e as águas de novo
começaram a ser lavradas
ganharam outro sentido
e os teus olhos
não sei porquê
choveram nos meus
Para lá do azul
estou a ver-te
assertivo por sobre escombros
a desbravar claridades
a desmandar o trilho dos barcos
e eu pergunto-me
quem te soprou os passos
para este cais?
que outro mar eu não sei?
segunda-feira, 21 de dezembro de 2009
NEM TODAS AS FAMÍLIAS SÃO UM PRESÉPIO
Por exclusão social ou sinal de ludidez
nem todas as famílias são um presépio
Foi assim que pensei
quando vi na esquina do prédio
uma senhora com uma criança ao colo
a pedir esmola
e a desejar boas festas
a quem passava
terça-feira, 15 de dezembro de 2009
ATÉ AS ÁGUAS SE FAZEREM AO MAR
A partilhar salivas
ondulámos os lábios
num instante cúmplice
quando o mar inteiro
nos teus olhos
ficou azul
A chuva prometia tempestades
e tu aparecias no cais
flor clandestina
a tactear a luz dos relâmpagos
perguntavas
se traziam sinais de madrugadas
a palavra certa
num ramo de oliveira
Estávamos no tempo dos barcos
vertebrados
que davam à costa
e se demoravam
por amor aos poetas inocentes
Assim ficámos submersos
a resgatar âncoras
até as águas se fazerem ao mar
quarta-feira, 9 de dezembro de 2009
MAIS AZUL QUE O CÉU
Numa cadência de remos e passos
se te pudesse transportar
seria num barco alado
para chegares como sempre chegaste
imaculada
a tecer estrelas de linho
solta
a navegar em arco
com um violino no regaço
Se fosses possível
num traço de azuis
bastava sulcar as águas
para vires à tona
construir outras pontes
incendiar as margens
mas tu sabes que não existem
barcos alados
Talvez por isso ainda te veja
em preces
sentada nas areias
a levar à boca a foz do rio
até o meu barco
ser mais azul que o céu
quarta-feira, 2 de dezembro de 2009
ONDE A LUZ SE ATEIA
René Magritte
Desde as últimas pétalas
que não te via neste mar
tão breve
solidária
pelo tempo fora
Reconheci-te peregrina
pelo ressoar das águas
Trazias referências inscritas
nas asas
uma espécie de destino
memórias incumpridas
sem palavras nem repouso
à descoberta de uma pausa
na fissura das escarpas
Gostei de te ver
no cimo dos meus olhos
onde a luz se ateia
Desde as últimas pétalas
que não te via neste mar
tão breve
solidária
pelo tempo fora
Reconheci-te peregrina
pelo ressoar das águas
Trazias referências inscritas
nas asas
uma espécie de destino
memórias incumpridas
sem palavras nem repouso
à descoberta de uma pausa
na fissura das escarpas
Gostei de te ver
no cimo dos meus olhos
onde a luz se ateia
quarta-feira, 25 de novembro de 2009
SOLTAR OS PÁSSAROS
Os cães choravam em silêncio
e eu não sabia porquê
Pensei no pobre limoeiro a afundar-se
lá onde nidificam toupeiras
ao entardecer
na estrela persistente
que viceja à noite no portão
nos olhos claros de um certo azul
que ilumina a casa
no desfolhar ensombrecido
das roseiras
Vasculhei tudo
invadi searas proibidas
até ao mais íntimo da pele
pó, sombras, sonhos
Perguntei-te - quando desaguas?
e tu desaguaste à janela
a marejar entristecida
e eu não sabia porquê
Foi quando os cães se levantaram
para soltar os pássaros
quinta-feira, 19 de novembro de 2009
QUE O RIO DESAGÚE
Quando o vento em lufadas
implacável zurzia
na fenda das escarpas
nós estávamos inocentes
nas ameias deste mar
a contar o tempo pelos dedos
Aguardávamos que o rio
desaguasse até ao fim
para a grande festa das águas
Só por isso soltámos os barcos
e as aves se embalaram
nos mastros enlouquecidos
e tu começaste a chover
relâmpagos nos meus olhos
Foi quando descobrimos
ao alcance das mãos
todas as belas tempestades
e nos desnudámos de tudo
com gestos simples e lentos
por todo o corpo
mas ainda hoje aguardamos
sábios e mudos
que o rio desagúe
sexta-feira, 13 de novembro de 2009
O MEU HERÓI
no chão que pisamos
já eu sonhava para ti
um mar azul
mas foi quando te peguei ao colo
que acrescentei um sinal
a uma palavra
que flutuava como um rio
nos meus olhos
Tudo passou a fazer sentido
a chuva o vento o relâmpago
a flor da oliveira
Se não me sofresse
como te poderia amar?
seguir os teus gestos
Ainda hoje nasceste
e já eras a minha estrela
o meu herói
terça-feira, 10 de novembro de 2009
AS PALAVRAS NÃO SABEM RESPIRAR POR GUELRAS
Sieghried Zademack
Todas as palavras são parcas
mesmo as que se afogam
por não saberem respirar por guelras
Foi assim que te dei um abraço
que não era um abraço
mas uma transfusão de sangue
e tu não sabias
nem eu
que abraços entre nós
são rios de luz
vasos comunicantes
Todas as palavras são parcas
mesmo quando voam
se fendem ou fundem
por lucidez ou distracção dos pássaros
Assim persistimos em destruir
e construir margens
para celebrar o ventre
e a foz do rio que desagua
Vivemos numa ilha cercada
de sonhos e sonos
Se tivéssemos um barco
seria inútil
Assim ancorados nas areias
até à fronteira dos horizontes
vamos continuar a destruir
e a construir
pontes e muros
só porque as palavras
não sabem respirar por guelras
Todas as palavras são parcas
mesmo as que se afogam
por não saberem respirar por guelras
Foi assim que te dei um abraço
que não era um abraço
mas uma transfusão de sangue
e tu não sabias
nem eu
que abraços entre nós
são rios de luz
vasos comunicantes
Todas as palavras são parcas
mesmo quando voam
se fendem ou fundem
por lucidez ou distracção dos pássaros
Assim persistimos em destruir
e construir margens
para celebrar o ventre
e a foz do rio que desagua
Vivemos numa ilha cercada
de sonhos e sonos
Se tivéssemos um barco
seria inútil
Assim ancorados nas areias
até à fronteira dos horizontes
vamos continuar a destruir
e a construir
pontes e muros
só porque as palavras
não sabem respirar por guelras
domingo, 8 de novembro de 2009
TANTOS MUROS POR DERRUBAR
Quando os interesses da direita política invadem o mais representado partido na Assembleia da República, o "socialismo" torna-se social-democracia e liberalismo - em nome propalado de uma pálida esquerda que se diz representar, mesmo considerando no P.S. um punhado de respeitáveis personalidades, que nele militam distantes da hierarquia instalada.
Deste modo bem pode este nosso pobre país almejar que se anuncie com firmeza, independencia e honra - a ordem e a eficácia na prática da justiça. Pelo menos que se verifique o declínio das manjedoras.
De facto as empresas públicas geridas por administrações não sujeitas a concursos públicos de avaliação de competências técnica cientifica e idoneidade expõem-se por nomeação política dos seus gestores.
As empresas públicas com estas orientações sistemáticas expoem-se antes de serem privatizadas a serem corrompidas pelos privados - não por serem empresas públicas, mas por serem geridas ( não quero generalizar ) por individuos corruptos com óbvia responsabilidade política de quem os nomeia.
Neste pobre país quando o Procurador Geral da República reconhece que há magistrados na Opus Dei e nas maçonarias, a "coisa" torna-se ainda mais complexa. Estas lojas não são a dos trezentos, são espaços fraternos notáveis e transversais de cumplicidades, com enquadramento legal.
Curioso ou talvez não - nos mega processos que abalam e afrontam o país - em todos eles - só é condenado um bibi, nunca o sistema.
Tantos muros por derrubar
terça-feira, 3 de novembro de 2009
O TRAÇO QUE NOS MOVE
João Cutileiro
No dia em que te disse
hoje não quero salvar o mundo
só ajudar
tu dormias profunda mente
riscada a carvão
numa folha de papel
bela
gaiata
desgrenhada
numa janela para o mar
Nesse dia tilintei pueril
no bico dos teus seios
acordei a voz dos pássaros
e nada mais aconteceu
a não ser o traço
que nos move
No dia em que te disse
hoje não quero salvar o mundo
só ajudar
tu dormias profunda mente
riscada a carvão
numa folha de papel
bela
gaiata
desgrenhada
numa janela para o mar
Nesse dia tilintei pueril
no bico dos teus seios
acordei a voz dos pássaros
e nada mais aconteceu
a não ser o traço
que nos move
sexta-feira, 30 de outubro de 2009
ESTAMOS SEMPRE A PARTIR
Antes da chuva nos bater à porta
já tinhamos sonhado
agitar tempestades
só nos faltava construir
um caminho certo para os barcos
Partimos rumo ao improvável
sem repouso infinitos
inocentes
nós e a chuva
em segredo estradas fora
construimos um barco
inventámos uma estrela
para seguir as aves
em pleno voo
Partimos antes da chuva
sem conhecer o destino das tempestades
muito menos o frémito
do tempo que faz
Vamos partir?
Estamos sempre a partir
e a chegar.
terça-feira, 27 de outubro de 2009
PRESO DE UM BEIJO
Quando chegas de mãos dadas
a rasgar neblinas
não fosse a obstinação
de olhar um desejo
já os barcos ardiam
na fímbria do mar
gestos mastros velas
até a âncora que me solta
nas metáforas
Quando chegas sem nome
cúmplice da água
não fosse o cântaro de barro
te afagar os lábios
para matar a sede às palavras
já teríamos criado outro deus
na inconsistência das salivas
Quando chegas
como se fosse a primeira vez
se não fosse
tudo seria inútil no teu corpo
mas eu continuaria preso
de um beijo
Quando chegas?
sexta-feira, 23 de outubro de 2009
O CHÃO DOS BARCOS
Lá fora os céus liquefeitos
tombam abruptos
dividem-se nos telhados
estatelam-se nos teus olhos
Apócrifas aves quase divinas
em poses magestáticas
lançam arrufos de ternura
desfolham-se infinitas
em silêncios sibilinos
de asas ventos e remos
Lá fora os céus coados
fingem que são chuva
e eu debruço-me
a meio da ponte
só para ver a água deste rio
o chão dos barcos
domingo, 18 de outubro de 2009
NA SÍNTESE DA TUA NUDEZ
As romãs estavam a abrir
em bagos vermelhos na tua boca
ao fundo a erva crescia desmesurada
por sobre a mesa e as cadeiras
onde sentamos os silêncios
quase todos
porque ainda reservamos passos
e asas na memória comprometida
bago a bago
folha ante folha
para não acordar os pássaros
Ali ao fundo vagueiam sem amos
madeixas de vento por um fio
Neste caminhar traço a carvão
nas paredes da casa
o teu corpo livre de sombras
desnudo-me com as romãs
na síntese da tua nudez
domingo, 11 de outubro de 2009
CAÇADOR DE RELÂMPAGOS
Um dia disseste que todas as estações são apeadeiros do meu corpo e eu respondi-te que uma folha caía a teus pés e tu disseste que não eram os teus pés mas tão só dois pedestais. Estávamos de novo no Outono e tu surpreendeste-me porque sabias que a folha caíu aos teus pés e voltaste a dizer mas de outro modo - Ai se os meus pés fossem pedestais.
Foi então em conversa com um grupo de árvores que todas me disseram para não reparar nas folhas que caem porque sempre algumas se levantam e até as persistentes gostam de um sopro para voar.
Quando a meio da noite, ainda os galos não cantavam, entendeste por bem revelar-me um segredo e disseste baixinho, para eu acordar devagar
-- Fui convidada para de novo assumir a pasta da cultura. Tenho 24 horas para decidir.
A fingir de sonâmbulo respondi-te em surdina
-- Eu tenho um convite para a debulha do trigo na Malhada dos Porcos.
-- Tudo bem, ajuda a reflectir.
Partimos. O percurso tinha boas memórias. Abandonámos a via principal, invadimos as azinhagas. Libertámo-nos no pó das coisas simples. Transcendemos o caminho. Voámos. Assumimos a dimensão do espaço e recordámos uma experiência que não resultou, não sei porquê.
-- Pensei ocultar os teus olhos nos meus só para te olhar mais de perto. Recordas-te?
-- Foi quando te revelei o meu hábito de olhar o chão.
-- Quando tropeçaste uma pedra para atirar à sombra dos pássaros.
Chegámos à Malhada dos Porcos. Já estavam a borrifar o chão da eira com água do riacho. Todos em redor e de mãos dadas. Em movimento quando entraram tímidas as ovelhas. Cantámos.
Circulámos com os animais. Calcámos o chão. Uma festa de amigos.
A roda com o tempo estreitava-se aos poucos até as ovelhas saírem, finalmente livres para os estábulos.
Agradecidos batemos palmas aos animais.
Entretanto chegou o acordeão e a guitarra campaniça. Começou o baile e os petiscos com doces conventuais até o chão ficar duro para no dia seguinte o trigo ser malhado.
-- Uma vergonha.
-- Não sei porquê.
-- Porque adormecemos altas horas na eira, por cima do cereal.
-- Ainda comemos pão daquele trigo.
A luz apagou-se. Acende os candeeiros. A trovoada aproxima-se.
-- Já não se pode dormir nesta casa.
-- Uma vez mais as belas trovoadas, a chuva a lubrificar a terra e os cães que não guardam relâmpagos a protegerem-se na casa dos donos.
-- Abre-lhes as portas.
Esta trovoada brinca aos relâmpagos. Vai e vem, ululante, ribomba nas fortes bátegas. Parece o fim do mundo mas é tão só uma violentíssima trovoada.
-- Ouviste?
-- Um estoiro no jardim.
-- Que belo estoiro.
-- Não me digas que o pára-raios caçou um relâmpago.
-- Recomeçamos?
-- A história da folha aos teus pés? A Malhada dos Porcos?
Já passou.
-- As 24 horas para decidires também já passaram. Serás a ministra dos meus galinheiros e eu vou aprender a caçar relâmpagos.
segunda-feira, 5 de outubro de 2009
COMO SE TIVESSEMOS UM BARCO
Joaquin Sorrolla y Bastida
As palavras vogavam soltas
em torrente
alagavam sapais
caldeiras de moinhos
As garças tricotavam pios afrodisíacos
e as canoas lançavam redes
para cercar os peixes
nas marés vivas
Os teus olhos debruçados na margem
circulavam em turvelinho
afagavam a faina
Quando nos soltámos crescemos
e lá fomos barra fora
como se tivéssemos um barco
que não anoitecesse
As palavras vogavam soltas
em torrente
alagavam sapais
caldeiras de moinhos
As garças tricotavam pios afrodisíacos
e as canoas lançavam redes
para cercar os peixes
nas marés vivas
Os teus olhos debruçados na margem
circulavam em turvelinho
afagavam a faina
Quando nos soltámos crescemos
e lá fomos barra fora
como se tivéssemos um barco
que não anoitecesse
terça-feira, 29 de setembro de 2009
PELA VIDA FORA
Estava em desassossego
a despertar o timbre
de outros mares
quando lançaste uma flor para o palco
Uma flor vermelha
de lábios doces
que recolhi pétala a pétala
Nunca soube quem és
muito menos do teu jardim
mas sei que me acordaste
pela vida fora
domingo, 27 de setembro de 2009
O POVO É QUEM MAIS ORDENA(?)
eugéne delacroix
Em 1830 Eugéne Delacroix pintou " a liberdade guiando o povo"
porque não bastava, não basta ter razão, é preciso ganhar o "povo" para a sua razão.
O "povo" à solta e a soldo perde-se de razões contra a sua razão, tresmalha-se na indiferença, vende-se sem estar à venda, venda-se e adere mais fácilmente nas rotundas do mercado das imagens e do poder, prescinde da força que tem, é um anjo que sofre, carrega andores e paga.
Não sei se vem a propósito mas não resisto a transcrever este diálogo a que assisti, por acaso, numa esplanada, duas horas antes do final para a votação nas legislativas.
"
- Não vais votar?
- Não sei.
- Pá - se não votares não podes pedir empréstimos aos bancos
- A esses gajos não peço nada.
- Tá meu - mas também não podes ser 1º ministro.
- Ok - vou votar.
- É um dever.
- Ok. serás meu motorista. "
O país ainda implume - após o acto eleitoral - deu um sinal.
O ps perdeu a maioria absoluta e declara-se vitorioso
O psd não atingiu a maioria relativa e declara-se o maior nas autarquias locais.
A CDU e O BLOCO são de facto a victória da ruptura e da esquerda com mais votos e deputados.
O cds é o regresso da extrema direita aos submarinos.
O povo é quem mais ordena?
Em 1830 Eugéne Delacroix pintou " a liberdade guiando o povo"
porque não bastava, não basta ter razão, é preciso ganhar o "povo" para a sua razão.
O "povo" à solta e a soldo perde-se de razões contra a sua razão, tresmalha-se na indiferença, vende-se sem estar à venda, venda-se e adere mais fácilmente nas rotundas do mercado das imagens e do poder, prescinde da força que tem, é um anjo que sofre, carrega andores e paga.
Não sei se vem a propósito mas não resisto a transcrever este diálogo a que assisti, por acaso, numa esplanada, duas horas antes do final para a votação nas legislativas.
"
- Não vais votar?
- Não sei.
- Pá - se não votares não podes pedir empréstimos aos bancos
- A esses gajos não peço nada.
- Tá meu - mas também não podes ser 1º ministro.
- Ok - vou votar.
- É um dever.
- Ok. serás meu motorista. "
O país ainda implume - após o acto eleitoral - deu um sinal.
O ps perdeu a maioria absoluta e declara-se vitorioso
O psd não atingiu a maioria relativa e declara-se o maior nas autarquias locais.
A CDU e O BLOCO são de facto a victória da ruptura e da esquerda com mais votos e deputados.
O cds é o regresso da extrema direita aos submarinos.
O povo é quem mais ordena?
sábado, 26 de setembro de 2009
quarta-feira, 23 de setembro de 2009
sexta-feira, 18 de setembro de 2009
QUANDO ERAS UM RIO
Quando eras um rio
a rasgar caminhos vertiginosos
e as escarpas seguiam
imaculadas os teus olhos
os peixes ficavam encarnados
na tua boca
nidificavam entre margens
enleados
Quando as sombras das pontes
nem sequer eram fronteiras
e eu disse que os rios correm
do ventre até à foz
tu sabias que só o mar
os acolhe
Quando eras um rio
eu dava os primeiros passos
na água
sábado, 12 de setembro de 2009
NO SENTIDO DO VOO
O mar sangrava espumas brancas
lenços de linho
nas ruas deste chão
Eu sabia que serenamente
no fim da Primavera
serias a última a partir
só não sabia que eras tu
Ainda desenhaste um círculo
para eu traduzir o teu rumo
Corri no sentido do voo
mas a água só me consentiu
um breve patinhar
Regressei à casa vazia
muito antes da luz
se afogar em palavras
segunda-feira, 7 de setembro de 2009
A RASAR O VENTO

Ainda não chovia
da ultima vez que raptei
o sinal que trazias nos olhos
Consentiste que fosse o ladrão
do teu olhar
mas tive que rasgar uma janela
por sobre as águas
Estavas num barco
caiado de branco
com palavras a arder
e eu perguntei-me
que fazer deste lume?
Aproximei-me e vi claramente
uma balsa sublimada
a rasar o vento
onde me transporto
quinta-feira, 3 de setembro de 2009
FESTA DO AVANTE

Na bela e disponível Quinta da Atalaia, beijada pelo Tejo, olhos postos no Moinho de Maré de Corroios, debruçada no pulmão da baía natural do meu Seixal - acontece a Festa do Avante.
Ponto de encontro com expressão nacional, a Festa afirma o PCP num grande espaço aberto a todos. Culturas e tradições.
Pessoas com e sem lapelas partidárias.
O mar arável este fim de semana vai à Quinta
da Atalaia.
sábado, 29 de agosto de 2009
ONDE NIDIFICAM AS MARÉS

A praia estava tão só
de tudo
que mais parecia uma casa vazia
até os azuis desmaiavam
num tresmalho de céus
Nem um barco, uma asa,
uma brisa, um pó
Só uma breve espuma
adocicava as areias tatuadas
Nesta elegia de silêncios
em repouso
as águas lamberam
os teus últimos sinais
mas não o mirífico lugar
onde se despem e nidificam
as marés
sábado, 22 de agosto de 2009
O PÃO CRESCEU NAS NOSSAS BOCAS

Ver-te assim tão indecifrável
nos contornos e nas arestas
ancorada nas marés
em chama viva
a entrar pela casa vazia
sem desistires do silêncio
a resistir mesmo quando doem
os passos e as pontes
fez-me pedir ajuda
a um cântaro de água fresca
às pedras que cantam e tropeçam
nos pés das videiras
Foi assim que nos despimos
e vindimámos
para os barcos cumprirem
o seu efémero destino
As uvas morreram nas tuas mãos
mas o pão cresceu nas nossas bocas
segunda-feira, 17 de agosto de 2009
A CASA VAZIA

nem eu vejo
no teu corpo
uma casa vazia
mas hoje
quando o vento nos bafejou
tão breve
reparei como o chão se desnudou
para os barcos desenharem na água
o baloiço das tuas ancas
adormecerem o perfume
em colares no teu corpo
e a luz arder a prumo
antes que a chuva se desmande
neste desassossego
de lábios e areias
Ao longe a casa vazia
com portas abertas
janelas escancaradas
para quando chegarmos
tudo fique mais azul
em cada sílaba
terça-feira, 11 de agosto de 2009
A VERDADE DOS SONHOS

"Para ser grande, sê como és. Nada teu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa, põe quanto és no mínimo que fazes. Assim em cada lago a luz toda brilha, porque alta demais. "
- Fernando Pessoa.
- Não, Ricardo Reis.
- Estávamos como estamos, num país onde os cães que não mordem se desesperam a ladrar.
- O Dique não ladra.
- Mesmo assim o país, com olhos tristes, ri de cócoras.
- Fernando Pessoa foi um místico.
- Vamos dormir?
- A esta hora todos dormem?
E foi assim neste diálogo de merda, quase institucional, que exaustos da amálgama de sons imperfeitos nos recolhemos ao paraíso dos silêncios tresmalhados.
Aqui - beneficiamos dos improvisos sábios do Dique, do generoso galinheiro com vistas para a rega automática, da serenata das folhas quando o vento lhes assobia.
Um dia parámos as bicicletas numa azinhaga, à porta de uma placa tosca, de madeira, que anunciava - "vendo patos".
Adolescentes como Ricardo Reis, comprámos uma pata com as suas dez crias. Todos mudos para não interferirem no belo canto do galo - um tenor ancião que subia ao poleiro para exibir a voz quando a luz acontecia. Na lua cheia chegava mesmo a enrouquecer, mas o país que o aplaudia, não votava.
Nesta harmonia aparente os patos cresceram e inesperadamente começaram a depenar as galinhas.
O galo deixou de cantar e o Dique esteve na eminência de ladrar mas conteve-se para não se confundir com o poder.
A noite estava cerrada quando decidimos intervir. Transportámos os bancos da cozinha para o galinheiro, um violino e o meu mais recente livro de poemas.
Patos de um lado, galinhas do outro. Nem um piu, um pestanejar de olhos. Só um ressoar de penas para aconchego das asas.
À porta do galinheiro o Dique, imponente - observava, sem dizer uma palavra.
- Começas tu com os poemas?
- Prefiro tocar violino.
Comecei a soletrar um poema e outro e outro, ao som do violino, até os animais adormecerem.
O Dique levantou a cabeça e fez-se luz. Começou a lamber a lua cheia e o galo despertou - começou a cantar.
Retirámo-nos pé ante pé para não perturbar o concerto.
No dia seguinte a pata tinha sido galada pelo tenor. As crias visivelmente reconhecidas afagavam as penas das galinhas, que punham ovos nos sítios mais incríveis.
- Acorda. Acabei de sonhar uma história.
- Outra vez o Ricardo Reis?
- Não a outra.
- Já ouvi essa história e continuo a não entender como é possível um cão de barro, numa noite cerrada, lamber a luz da lua cheia.
Onde está a verdade dos sonhos?
quarta-feira, 5 de agosto de 2009
QUE FARÁS DE TI ?
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Ainda não estávamos no tempo das vindimas, nem da fuga das andorinhas. Estávamos a regar uvas de mesa para te oferecer numa bandeja de lua cheia - mas tu estavas no paraíso dos silêncios a aprender, a prender ou a soltar amarras de barcos, a voar com o próprio voo ou a cortar asas aos pássaros, sem teres espreitado o belo precipício das lindas tempestades - onde só cantam livres alguns fios de música quando lhes morde a voz.
As uvas estavam verdes, o tempo incerto e o chão íngreme já te desafiava em revérberos num turvelinho de rotas.
Quando vencemos o teu cordão umbilical, despertámos para uma certa revolução de estrêlas e ninguém sabia o que era uma revolução de estrêlas. Talvez um dia saibas que as estrêlas podem brilhar no chão que pisamos, conforme as marés - que todas nascem, crescem e regressam como pêndulos a outras florações.
A lua não estava cheia, as uvas estavam verdes, as andorinhas só regressavam à noite e tu deste um grito que estilhaçou todos os silêncios.
Não foste um silvo de barco, nem um mar a rasgar escarpas, nem sequer o delicioso florir de uma araucária. Foste tu e já é tanto.
E agora? Que farás para a água te lavar os pés? Que farás para o mar não te abandonar? Que farás para te conquistares? Que farás para as uvas amadurecerem e as andorinhas regressarem?
Que farás de ti, pelas outras estrêlas.
domingo, 2 de agosto de 2009
quarta-feira, 29 de julho de 2009
LISBOA NO CAOS DO SODRÉ

António Costa e Santana Lopes - candidatos à presidência da Câmara Municipal de Lisboa foram dois advogados a falarem de finanças. Evidenciaram dois zeros - um à esquerda e outro à direita.
Esta foi a diferença - a posição dos zeros. Um potencial candidato a primeiro ministro, o outro ex-primeiro ministro por acidente, a "recibo verde".
Olhos postos no monstro político da bipolarização, exibiram a contabilidade dos números no primeiro debate televisivo.
Antes das eleições legislativas, a setenta e três dias das eleições autárquicas - o eleitorado - "óbviamente" o que mais domina, são os números. Admito mesmo que estivesse a contar pelos dedos nas esplanadas para saber das contas do município - o deve. o haver e o pagar das dívidas de cada um dos candidatos.
António Costa na ausência de uma coligação política credível com incidência partidária responsável, preferiu uma caldeirada sem ideologia.
Santana Lopes reabilitado a pedido de várias famílias, tenta de novo uma luz ao fundo do túnel.
Imagem/ sondagem/ sacanagem/ - um "versículo" de Manuel Alegre sugere-nos ( apenas sugere) que nem António Costa é Duarte Pacheco nem Santana Lopes é Pina Manique.
Melhor seria que um e outro recuperassem de uma gripe, que lamentávelmente não os bafejou.
Deste modo Lisboa vai estar em disputa
no caos do Sodré
quinta-feira, 23 de julho de 2009
NA HORA DO GADO

Os silêncios não são todos iguais. Este é o da vasta planície aloirada, mais longo que o espaço dos teus braços abertos. Um silêncio pontuado por rebanhos, azinhagas e azinheiras. Um silêncio de cal e casas rasteiras. Cânticos em grupo ao ar livre quando a lua está cheia e os homens se encontram para falar, cantando.
Neste silêncio de ventos brandos e quentes - que nem parecem ventos - os olhos do senhor Anastácio não se vergam.
Nunca foi maioral mas fazia milagres com o assobio. Cruzava a "estrada" com a bandeira nacional hasteada no cajado, para anunciar ao silêncio que o gado lento ía atravessar.
Pastor de sonhos, dormia com os animais. Só aparecia em casa aos fins de semana.
No Verão, quando o tempo fervia o sangue da planície e o silêncio se tornava insuportável, quando a vida se tornava palha - alugava um táxi na aldeia e levava a mulher e os filhos ao litoral, só para que vissem o mar.
Encharcava os moços de brilhantina e a mãe protestava.
- Tanta brilhantina Anastácio.
- É para os moços não se perderem na praia.
Sentados nas areias molhadas, enquanto os putos se perdiam de vista, o senhor Anastácio dizia baixinho.
- Maria, este não é o meu mar. Esta não é a minha gente. A minha gente são os teus olhos de mel.
- Não mintas.
De súbito o homem do táxi alertou em voz alta.
- Anastácio, está na hora do gado.
Um assobio silvestre e a canalha tresmalhada não apareceu. Teve de percorrer o rasto da brilhantina.
À chegada o gado à solta balia e o senhor Anastácio disse uma vez mais- baixinho.
- Meus filhos, só vocês não se perdem.
sábado, 18 de julho de 2009
NA CLARIDADE DAS ÁGUAS

Quem decide àcerca do curso
dos rios nem sempre
são as margens
Conheço rios que seguem loucos
as rotas das aves
Lembras-te
quando rasgámos
por uma fresta
os caminhos do mar?
O vento tinha nas veias
o ciclo das marés
e o teu corpo fluido
ainda hoje é um deus
à semelhança de um sopro
uma sombra linda
na claridade das águas
sexta-feira, 10 de julho de 2009
POR ENTRE OS DEDOS


Deixámos um rasto
fluorescente no escuro
para as aves se guiarem
Quase indecifráveis
marulhámos sussurros
sem preocupações de chamar
grandes nomes às coisas
No princípio éramos assim
polidos como seixos
tão perfeitos
que ainda hoje temos o rosto
esculpido na água
Com a noção clara das noites
brincávamos com as sombras
desenhávamos garatujas
em todos os mastros
soprávamos o vento
Quando demos mais um passo
para ultrapassar o tempo
obsessivos pela lonjura
recolhemos a outra dimensão
dos teus cabelos brancos
à solta
por entre os dedos
sábado, 4 de julho de 2009
PARA LÁ DO AZUL

Aqui tão perto dos infinitos
no ponto mais distante do deserto
presos por um fio
a meio da ponte
ainda hoje celebramos
as margens
para escrever no azul
metáforas trabalhadas na água
palavras brancas
Ainda hoje
temos o corpo dividido
em pequenos deuses
mas quando partimos
num barco em flor
sonâmbulos como potros
do chão firme das espumas
erguem-se aromas incríveis
na mais transparente verticalidade
Descobrimos
que para lá do azul
talvez ainda seja mar
domingo, 28 de junho de 2009
O TRANGALHADANÇAS

A pedido dos monges da Arrábida foi construída uma fortaleza para proteger o litoral. A vida pode ser uma surpreza. A fortaleza, hoje museu oceanográfico é uma referencia no corpo da serra.
Deslumbrados com o património florístico e os monumentos geológicos deste sopro da natureza, percorremos magestosas paisagens na bio-diversidade deste ecossistema.
Desaguámos na enseada do Portinho, numa das mais belas baías do mundo, no espaço poético de Sebastião da Gama.
A doce Arrábida debruça-se abrupta em madeixas de verdes até afagar o rio azul, à vista de roazes e finíssimas areias.
Na esplanada de um restaurante, com os olhos nos olhos dos peixes e dos albatrozes, distribuíamos miolo de pão, saboreávamos salmonetes, nascidos, crescidos e baptizados no Sado.
Não fora a exploração desastrosa da alma e do corpo da serra para a produção de cimentos, uma ferida que sangra os olhos, mais a recente memória da incineradora de lixos tóxicos em nome do mercado de capitais, estaríamos sem máculas num pulmão que respira.
- A serra queixa-se do trangalhadanças.
Na mesa ao lado um sujeito de cabelo grisalho e nariz ponteagudo, tresandava a brilhantina. Levantou um braço, limpou-se a um guardanapo de papel e questionou-nos com voz falsete.
- Trangalhadanças? Estão a falar comigo?
- Naturalmente sr engenheiro.
segunda-feira, 22 de junho de 2009
À PERGUNTA DO MAR

Estava com os olhos presos
no espelho do rio
quando as margens
se moveram
com aves a acenarem
famintas de um sinal
para fluirem
Das águas submersas
o coaxar dos remos
regressou à tona
Os saveiros passaram
a andar num rodízio
de memórias
Bastou libertar um pó
para desprender os olhos
partir para a faina
à pergunta do mar
terça-feira, 16 de junho de 2009
ROTA NAVEGÁVEL
Não sabíamos que os rios
podiam cair dos céus
sem deixarem de ser água
mas quando te vi
tão livre líquida quase humana
a moldar arestas
vesti a pele das aves
para descobrir o sentido do voo
a voz abrupta dos violinos
Adentro prisioneiros com destino
num instante de chuva
a desaguar por sobre as pedras
eternos e frágeis
compreendemos o sopro do vento
contra o vento
começámos a construir
a pulso
gota a gota
uma rota navegável
sexta-feira, 12 de junho de 2009
MILITANTES DA VIDA
A vida oferece-nos exemplos magnânimos de cidadãos íntegros que se evidenciam pela entrega a causas comuns e marcam gerações.
A 11 e 13 de Junho de 2005 - três militantes da vida, legaram-nos valores que são património inestimável para todos os amanhãs.
Presto-lhes esta modesta homenagem.
Não deixemos morrer os nossos mortos.
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