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À proa das palavras
despertaram acordes
numa constelação de silabas
passo a passo
soltos de rimas e pautas
rasgaram margens e destinos
desaguaram cúmplices
nas paredes do mar
num beijo apertado
lá estávamos a povoar afectos
como se fossemos barcos e somos
à proa das palavras
Eufrázio Filipe
A deshoras
vi barcos soltos
perdidos de azuis
e outros mares
colhiam beijos sem mácula
num afago de limos
amarados ao vento
inscritos nas paredes do cais
cumpriam uma rota
contra todos os destinos
quase (e) ternos
a desvendar palavras
em pleno voo
menos livres
que os pássaros
Eufrázio Filipe
"Chão de Marés"
As florestas não existem para serem consumidas pelo fogo - por negligência ou interesses privados.
Há quem tente proteger-se nos fenómenos naturais
como se fosse inevitável provocá-los.
O fogo purifica mas assim não.
Estavam no cais
os barcos de remelas
etéreos
quando partimos
por sobre as águas
sem fim à vista
foi assim
lá onde os olhos sem amparo
de consentem demorados
assistimos à passagem
de um sopro de vento
Neste leito de sussurros
a primeira chama navegava
todos os degraus da escarpa
foi assim
tresmalhadas as pátrias
chegámos à fala
de mãos dadas
no íngreme caminho das pedras
Eufrázio Filipe
"Chão de marés" editora Lua de Marfim
Há um sulco invisível na água
onde viajo
e me transformo
talvez por isso
não faça sentido atear velas
queimar incensos
mexer nos ponteiros do relógio
inventar um barco e partir
folha ante-folha
talvez faça sentido
desbravar fronteiras
repartir afectos gorjeios e migalhas
no púlpito das cerejeiras
Eufrázio Filipe
"Chão de marés" 2013/2016 Lua de Marfim editora