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"mulher pássaro" ósseo de Graça Morais
Há tantos anos
que te não via os olhos
de tão perto os conhecer
foi preciso um pássaro
ajudar-me a fazer lume
rasgar janelas
na direcção do vento
e com um fósforo
atear fogueiras
só para os ver
lá estavam
na folhagem das oliveiras
No entardecer da praia-mar
desprendidos barcos
invadiram a rota das águas
hastearam-se em coro
num sonho navegável
Povoadas as margens
quando de novo
as palavras sangraram
na escuridade das marés vivas
um pássaro poisou
nas tuas mãos
para o levares aos lábios
CADA APEADEIRO
UM NOVO IMPULSO
PARA A VIAGEM
DESGOVERNO RUA JÁ
Roubem-me tudo
os lápis de cores
as minhas flores preferidas
mas não me roubem
os olhos por onde vejo
um mar que não se verga
Roubem-me tudo
menos um verso
Num sopro de remos e passos
tento dar às palavras
a leveza das cinzas
silêncios expostos
derramados
na fissura das pedras
para agigantar em campânula
as paredes da casa
mas quando abro o portão
do cais
e solto os cães
para ouvir a escarpa
só os pássaros livres
não deixam de cantar
dardejam
nos mastros
para os barcos se moverem
(
Reeditado)
Já tinham colhido as flores do jardim
mas tu cumprias um caminho
desaguavas como um rio
e eu não sabia que respiravas
à flor da pele
por todos os póros
Muito antes de me ajudares
a plantar uma árvore
procuraste a margem
Tão líquida por entre os dedos
construíste um corpo uníssono
contra todos os destinos
Encontrei-te com um simples toque
numa folha de papel
a vaguear no espelho das águas
dedos nos dedos
até ao início das mãos
Queria ver uma multidão
uníssona
em cada gesto teu
e vejo
Queria que tivesses um oceano
organizado
no azul dos olhos
e tens
Queria que fosses um corpo de asas
mas insistes em chamar às coisas
apenas o nome que elas têm
Quando a noite luz
ateio-me
num abraço de limos
escrevo em branco
onde se movem
sombras de pássaros
pétalas soltas
mares desgrenhados
na cadência do relógio de pêndulo
Pelas frinchas
oiço perfeitamente
o vento que faz
o uivo dos cães
o ranger das gáveas
o despontar em surdina
de novas flores no cais
Escrevo em branco
para não ficarem sem memória
as paredes da casa