sexta-feira, 27 de julho de 2007

A BOLA DE BERLIM

desenho de Mário Filipe Tu sabes Dique - na vida, por vezes, um homem tem que ladrar

aos cães.

Compeensivo - o Dique olhou-me, e lá fomos.



Estava um senhor representante de um país rico a discursar no púlpito de uma cimeira com pobrezinhos na plateia - de modo a chegarem a um acordo original - "quem manda aqui sou eu" - e tudo continuar como antes - isto é, os pobres cada vez mais dependentes e estupidamente felizes na bandeja dos "subsidios".

Fui com o Dique assistir ao discurso, no segundo balcão do auditorio e concluimos - ainda o senhor estava na leitura do primeiro rolo de papel - A VIDA NÃO É SÓ CONTEMPLAÇÃO E VALE A PENA INTERVIR NA PAISAGEM.

Foi o que fizemos.

O Dique ladrou em falsete, eu cantei a Grandola Vila Morena e ouvimos ao lado alguem bater palmas ao nosso protesto - até sermos expulsos da galeria, após identificação.

Saímos incomodados. A rua vigiada sugeriu-nos uma pausa no café da esquina.

Olhei o Dique ainda não refeito da expulsão. Estava triste.

Disse-lhe determinado - será melhor falarmos de nós. Acalmado concordou e eu comecei a vaguear pela memoria.

Um cão pode ter caracteristicas sublimes de personalidade.Depende do cão e do dono, das condições que ambos conquistaram na vida e da parceria que acordaram nos olhos um do outro.

Não estou de acordo com o Snoopy quando diz - "ontem era um cão.Hoje sou um cão. Amanha provavelmente serei um cão. Há tão pouca esperança de progredir". Curiosamente o Dique também não está de acordo com o Snoopy.

Quem és tu Dique?

Não é simples de explicar,mas em síntese, és um cão.

Aos meus olhos és ainda mais que um cão.Porquê? Porque tens sentidos. Porquê? Porque és vertebrado e quase humano nos caminhos que percorremos, nas histórias que inventamos, na cumplicidade que partilhamos.

Na verdade tudo tem um principio mesmo que a explicação seja simples. Na verdade criei um objecto animado para protagonizar comigo - silêncios, memórias e afetos.

Tornei-me ventríloquo?

Uma coisa é certa - tu existes e chamas-te Dique.

Um dia, no lugar da Volta da Pedra, na berma da estrada nacional, parei numa venda de barros. Tinha a ideia de comprar um vaso e acabei por comprar um cão. Exactamente - um cão de barro .

Sempre pensei que nesse preciso instante estava apenas a comprar um objecto decorativo. Nunca pensei que um dia aquela coisa poderias ser tu Dique. Parece que foi ontem.

Sentado sobre as patas traseiras, porte altivo, orelhas espetadas, olhar terno, bem esticado de coluna, cheio de pó e corpo de barro. Olhamo-nos e parece que te ouvi dizer baixinho - "tira-me daqui".

Resultado - não comprei um vaso, comprei um cão.

Comprei-te barato e coloquei-te onde me pareceu mais certo - à porta da casa.

Ali ficaste todo o inverno.Ao sol, à chuva, ao frio.

Um sentinela.Hirto, sem pestanejar.Uma estátua vigilante e leal a cumprir uma tarefa, um desígnio histórico.

Recordas-te? Passava por ti e não me apercebia que eras um cão. Só tu sabias.

A vida tem razões que a razão não entende e talvez por isso valha a pena ser sonhada, recriada, partilhada.

O inverno passou, nu e cru como são os invernos.Não arredaste pé até que no despontar deste verão - desapercebido ou enamorado da lua cheia, ao fechar a porta da casa, assustei-me com o teu vulto. Nem parecia noite e tu projetavas sombra com a dignidade do primeito dia.

Nervoso - sorri-me com um esgar repentino. Assustei-me.

A partir daquele momento inesperado comecei a olhar-te como um animal de carne e osso.Deixaste de ser um objecto coisificado. Passaste a ser considerado um parceiro com quem podia contar para os bons e maus instantes.

Reconhecido foste batizado solenemente e hoje chamas-te Dique.

Pintei-te todo de preto. Coloquei-te dois brilhantes nos olhos e um dia

a nossa avó num rasgo de criatividade, chegou a dizer - "o Dique é a melhor pessoa que habita esta casa".Porquê? Porque um cão depende de si e do seu dono, e por vezes o contrário não é menos verdadeiro.



Por tudo isto entendemos hoje ir ao auditório.

Sonolento o Dique ouviu uma vez mais a nossa história.Terminámos a bola de Berlim.Saimos do café da esquina.

Admitimos que a cimeira tivesse encerrado, pois o tal senhor do discurso que reconhecemos na via pública, gritava - " DER SIEG,DER SIEG".



A rua ainda estava vigiada.Ainda rosnámos.

Peguei no Dique e regressámos a casa.

sexta-feira, 20 de julho de 2007

MADRE INÊS


desenho de Mário Filipe
Hoje acordei ainda os barcos estavam de ramelas e lavagem de porões -numa ilha quase imaginária.
Com os restos sonâmbulos de um sonho acordado,surpreendi-me
com um pensamento -
Hoje não quero salvar o mundo,só ajudar.
Na verdade é necessário coragem para renovar,sem perder o traço
fundamental do legado histórico e afetivo.As memórias de hoje foram
inovações no passado e a vida em sociedade é também este ritmo natural
e incontornável de estarmos no nosso tempo - por vezes contra o nosso
tempo - sem fossilizar nem castrar os sonhos.
Hoje acordei assim - a sorver o ar fresco da manhã.Acordei lentamente por entre neblinas atlânticas,a partilhar o voo assimétrico
mas equilibrado de um açor,quando inesperadamente fui invadido por
um silvo estridente,quase um choro de criança - uma farpa nos tímpanos.Era o meu telemóvel de primeira geração.
Atendi - não fosse uma ordem para evacuação do hotel - um eminente despertar vulcânico,uma revolta da direita autonómica,o reinício
da caça às baleias.
Atendi e reconheci de imediato - a minha gata.
Tenho algures uma amiga que nunca vi e me telefona ciclicamente.
Sensual,com dicção perfeita,lê-me sempre o mesmo poema -
Se tivéssemos um barco/ai se tivéssemos um barco/tinhamos o mundo/e seria inútil.
Esta minha amiga não dizia mais nada mas terminava sempre
com um inigmático - miau.
A vida não é fácil,mas com paciência,generosidade e algum prazer pessoal,tenho contribuido para esta ladaínha.
Uma vez mais o silvo do telemóvel.O cumprimento do mesmo ritual.
De facto - a voz terna e meiga da gata,clarinha como a água,
aparentava um animal de fino porte,pêlo fofo,olhos de esmeralda,
pernas cheias,busto virtuoso,anti-fascista e sensível às noites de jaze.
Deste modo vivi este monólogo erótico que me transportou - não sei
porquê - para uma cena metafísica.
Num vagaroso instante,abandonei a ideia do telefonema ser da minha amiga e fui assolado por uma outra possibilidade ,talvez mais hilariante.
Teria a galega - madre Inês - perscrutado a espuma dos tempos,
quando desviou a imagem do "senhor santo cristo" de um lugar ermo
da ilha para Ponta Delgada,assim menos exposta aos apetites liberais dos piratas da época?
Uma coisa é certa - a escultura do "santo" é uma rica peça de arte,
um prodígio encrostado de preciosidades e sacrifícios humanos.
Transfigurada por vontades pagãs,prespassou para um destino sublimado de fé e turismo religioso - e eu,vulgo mortal,de telemóvel
no ouvido,coçando a barba,fixei-me uma vez mais no voo assimétrico
mas equilibrado do açor - que me confidenciou -
Agnóstico,também eu me sinto profanado.

Entretanto os barcos permaneciam ancorados.
O s pássaros,as aves marinhas,eu mesmo -"levantados do chão"
já ousávamos viajar mar adentro.

Mais tarde - um pouco mais tarde - um novo silvo - a terminar
como sempre
MIAU

Entendi responder pela primeira vez.
ÃO - ÃO

E assim ficámos - esclarecidos - para toda a vida.




sexta-feira, 13 de julho de 2007

O VOO DO MOSCARDO

desenho de Mário Filipe




Após o repasto,dispersaram os convidados e alguém se lembrou de

Rimskikorsakov.

A noite - quente -esplendorosa e sempre poética caía em nuances

polícromas - as cigarras ensaiavam cânticos sedosos que afloravam

a folhagem.O silêncio melódico estava reposto e a lua cheia tão linda,

desenhava no chão os recortes da casa,iluminava os nossos corpos.

Cantava.

Estávamos no campo,no mar arável das videiras.

Apesar do êxtase a família residente ainda se propôs ouvir o espargir

da água na rega automática.

Entretanto a paz onírica foi interrompida abruptamente e a família

unida - declarou caça a uma mosca varejeira que distraída das regras

democráticas entendeu devassar a cozinha.

A mosca,de facto,era um espectáculo - uma verdadeira besta de insecto.Enorme de asas,gorda,cor do petróleo,patas felpudas,celulite irreversível.Uma suculenta matrona.

Alguém afirmou ter-lhe visto uma cremalheira panorâmica de alvos

dentes aguçados.Na verdade não tinha lábios - exibia com mau gosto erótico uma beiça,tipo ventosa e cheirava a orçamento do estado.

Resultado - mobilização geral.

Em zig-zagues acrobáticos sobre as nossas cabeças,bufava,zunia,

zumbia zumzuns,riscava o espaço com uma baba fluorescente.Quase

política de direita,esfregava tímida as patas dianteiras e discursava arrogante sem aplausos nem substância,ao seu jeito - fluente palha

e em falsete.

Onde poisava deixava marcas,ameaças,impropérios,prepotências

e algumas rezas.Mostrava de quando em vez os olhos fulvos em desafio à lua cheia.A espaços tremulava as asas que pareciam bracinhos,como se fosse uma libelinha.Queria não parecer uma mosca varejeira.

Conclusão - na ausência de uma política coordenada e eficaz para a segurança dos cidadãos - voluntários - movemos-lhe caça cerrada,

meticulosa,com estratégia e tácticas cientificamente aceites na comunidade europeia.Utilizámos códigos em surdina,transmissões

gestuais - armas em riste.

Para a família a questão era tribal e honorária.Fervia-nos o sangue

nas coronárias e houve mesmo alguém que gritou - abaixo a mosca,

viva a liberdade.

Enfim - até o doce de tomate ,caseiro,que demorou à nossa avó seis

horas a cozinhar em lume brando,colher de pau em tacho de barro -

tomates sem pele nem graínhas,ao som da música - até o doce de tomate,cozinhado como quem vai a Fátima a pé lhe oferecemos de bandeja.

Demos-lhe poesia de Florbela Espanca,fizemos-lhe a mesa,demos-lhe

cama e roupa lavada.Estudámos em concílio improvisado o comportamento social dos insectos - chegámos mesmo a ler algumas

crónicas do Eduardo Prado Coelho - tentámos em pausas consensuais

alguns contactos políticos.

As incontronáveis férias são assim.As lojas do cidadão ficam desertas

ficam abertas apenas as maçónicas.O país encerra para transpirar e

até os políticos são considerados filhos de deus.

Entretanto a perversa mosca voejava na cozinha,mobilizava a família.Por vezes aparentemente brincalhona - saltitava nos ponteiros do relógio - escondia-se no buraco da fechadura da porta,nos buracos do queijo flamengo,nos póros da nossa imaginação.Formigava no pingo de suor que escorria lento,curto e grosso pela orelha da avó e em raides

fulminantes,tresmalhava,espreitava e sumia-se como o ar em movimento.

Na sala ao lado - a rádio anunciava mais um ataque à função pública

e a verejeira,espartana mas exausta,finalmente poisava e sorvia no doce de tomate - o seu último desejo.Uma rendição.

A família em bloco,felicíssima - caíu-lhe em cima.Foi mesmo comovente ver toda a tribo unida em torno de uma questão concreta.

Reunidos entendemos não matar a varejeira como se mata uma qualquer mosca.Partimos todos em procissão e fomos depositá-la,

com o doce de tomate irrepetível,junto de um magnifico cipreste.



Regressámos - em silêncio.A lua ainda estava cheia.O Voo do Moscardo - oferecia-nos os últimos acordes.









sexta-feira, 6 de julho de 2007

SIM SENHORA MINISTRA

desenho de Mário Filipe


Inconformado mas tranquilo navegava descontraído ao sabor da música de Nat King Cole, pelas ruas da net. A sorver um inestimável cigarro naveguei, naveguei, até entrar por acaso numa sala de conversa, em mesa redonda. Cumprimentei com um olá abrangente. O forum pareceu-me uma récita de finalistas e alguém entretanto respondeu-me com voz terna e macia com outro olá.Trocámos moradas e um outro dia cliquei - zebra@ mail.pt.
Acordámos um encontro na pastelaria Versalhes.

Era sexta feira,dia das cidades sem carros e na avenida da República foi comovedor apreciar um punhado de gente a correr como espermatozóides a respirarem finalmente pelos pulmões - de bicicleta de patins, a cavalo, ao pé coxinho - vitoriosos, saltitantes, castos e inocentes.
Ouvi alguém recordar que o vento é o ar em movimento.

Na verdade o governo nas varandas de São Bento, em estado critico de parto orçamental, aplaudia-se a si mesmo enquanto o ar quimicamente puro entrava e saía nos amplos salões.

Estávamos nos últimos lampejos do verão quando me dirigi ao micro clima da Versalhes que distinta luzia nos florais dourados, nos tiques barrocos da fauna residente, no brilho cristalino dos espelhos, na nata das conversas, nas minhas lentes de contacto.

Às dezassete em ponto, uma galáxia de estrelas candentes entrava na pastelaria. Dirigiu-se à minha mesa. Parecia uma papoila. Não andava deslizava, volátil, aparentemente frágil mas insinuante. Vestia seda natural exibia discretos viveiros de rosas polícromas - cravos nem um.

Alta, amendoada, olhos felinos nuca rapada - calou a Versalhes e eu confesso que fiquei com a ideia de ver uma personagem conhecida.

Cumprimentámo-nos com alguma solenidade. A sua mão ou a minha tremia humedecida.

Tomámos o chá em porcelana bago de arroz e falámos, falámos - ternos, criativos, inocentes.

Conclui que talvez pertencesse à comunidade de Santo Egídio, empenhada na cultura para a paz, na mediação internacional - uma frente organizada e independente - mas - da total confiança política do Vaticano.

Inesperadamente fui convidado para visitar a piscina interior de um hotel. Com a naturalidade de quem procura substância para uma crónica, aceitei o convite.

Desviámo-nos um pouco da Avenida da República, apanhámos um táxi, chegámos ao hotel - obviamente um cinco estrelas.

No lancil, uma jovem andrajosa raspava as cordas de um violino lacrimoso, rezava por uma moeda, num debotado copo plástico da coca cola. Parámos enquanto ela olhou a rapariga. Com os dedos esguios retirou um brinco da orelha que deixou maternal no copo das esmolas.

Com o mesmo sentido cooperante deitei a mão ao bolso do casaco mas só encontrei um auto-colante contra a co-incineração na serra da Arrábida.
Entrámos. No átrio da piscina a música de fundo oferecia Nat King Cole

Pedi um Cuty Sark e a minha companheira, como se estivesse na intimidade do doce lar. começou a despir o vestido de seda, a espargir um ténue perfume a rosas e a revelar um lindíssimo fato de banho.

As riscas de zebra, perfeitamente selvagens, listavam-lhe todo o corpo amendoado. Colada à pele penetravam-lhe os ângulos, as reentrâncias, os espaços bojudos, os precipicios -- das unhas dos pés, até à nuca rapada.

Por dentro não vi nada de muito significativo, mas quando - lenta e solenemente se aproximou da água, reparei que não tinha uma única peça de roupa vestida. Numa nádega era evidente a assinatura do pintor.

Rodando o pescoço, óptimo para o sinistro tempo da guilhotina, olhou-me fixamente - com outros olhos. Estava triste. Revelava uma profunda solidão interior - e eu inquietei-me.

Sempre a fixar-me deu uns passos e permitiu que uma lágrima solta, desamparada, tingisse a água da piscina. Mais me inquietei quando não conteve um breve sorriso nervoso e me interrogou, terna e com voz macia.
Fui remodelada, sabia?
Compreensivo e terno, respondi

Sim senhora ministra

quarta-feira, 4 de julho de 2007

CUIDADO COM OS DONOS OS CÃES ESTÃO PRESOS

parlamento europeu






A nova legislação vai ser aprovada amanhã e segundo o projecto

prevê-se que os donos terão de sujeitar-se a exames de aptidão

psíquica e física.



Entretanto o presidente do Rottweller Club de Portugal disse -

"somos a favor das responsabilidades dos donos mas contra a discriminação das raças - a listagem que existe em Portugal

é completamente desadequada da realidade"



CÃES



Não sejam a voz do dono








segunda-feira, 2 de julho de 2007

COMISSÁRIA MARGOT


NEM TUDO NA UNIÃO EUROPEIA É BUROCRÁTICO.PARA O PROVAR BRUXELAS COLOCOU

NO SEU ESPAÇO,NO SITE DO YOU TUBE,UM VIDEO COM 18 CASAIS A FAZER SEXO.A AUTORA

DESTA INICIATIVA É A COMISSÁRIA RESPONSÁVEL PELAS COMUNICAÇÕES,A SENHORA

MARGOT WALLSTROM.(DIÁRIO DE NOTICIAS)


OBVIA E LAMENTAVELMENTE A FOTO NÃO É DA SENHORA COMISSÁRIA

MAS POR ESTE CAMINHO DESEJO PARA UM DIA DESTES UM STREEP COMPLETO

AO MAIS ALTO NÍVEL

PARA QUE A TRANSPARENCIA ACONTEÇA NO "TRATADO" CONSTITUCIONAL

E OS POVOS DECIDAM ÀCERCA DO MELHOR DESEMPENHO.

FELICIDADES - PARA A PRESIDENCIA PORTUGUESA


"OPERA" BUFA

foto da net




Nesta república que alguns querem das bananas


Correia de Campos


pisca o olho


ao ministro da saude


É de homem