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Quando a estátua
deixou de ser estátua
eu vi
uma lágrima solta
nos olhos
da pedra
Regressados os barcos
às areias movediças
com mãos de linho
por um fio
tricotavas sinais
que se ajustavam
ao nosso corpo
guardavas segredos
pátrias navegáveis
e outros céus
como pedras
em voz alta
na escarpa
Regressados os barcos
repetidos
nada mais foi importante
que o pão beijado
no labirinto
dos teus lábios
Sem me fixar nas cores das lapelas
só nos olhos polícromos
parece-me que o quadro social à vista, injusto e dramático, transcende a legítima diferença de cores, convoca as pessoas para um grito
indignado e uníssono
Lá estarei
porque não basta ter razão
Neste belo deserto
povoado de silêncios
lábios areias e coisas lindas
quando vi os pássaros
aos molhos
num só ramo da araucária
com pausas soletradas
numa cadência exausta
de trinados e vírgulas
levantei-me da sombra
com os cães
para colocar as palavras
em ordem
nos acordes da folhagem
e nada mais aconteceu
Ainda não aprenderam
os meus olhos
a verem-te
como és
mas apenas como te vejo
Nesta aldeia
de mares imperecíveis
e sábios tristes
íntegro um pássaro do alto
entendeu por bem
atiçar o fulgor dos timbres
regressar ao cais
soltar os barcos
e partir
nas cordas vocais
de uma guitarra
Nesta aldeia
refúgio
à flor das águas
ainda há espaço para cantar
Nem todos os jacarandás
rebentaram em Maio
mas tu cumpriste
o ritmo das estações
contra o tempo que faz
vestiste-te de púrpura
com cheiro a hortelã
sentaste-te no meu silêncio preferido
dedos esguios em flor
a crescerem nas teclas do piano
Nem todos os jacarandás
rebentaram em Maio
porque não existem horas para amar
porque é possível pintar
uma flor com a boca
na tua boca
e ficar assim
eternamente a respirar