terça-feira, 30 de abril de 2013

ATÉ SER DIA





Nua de tudo
como se fosses jovem
e és
a espargir silvos
em sobressalto
tão azuis
os cardos despontam
nos jardins de Maio

Nua de tudo
por sobre as pedras
não basta voar
é preciso ser pássaro
mais alto que o vento
à solta

transportar aromas
mãos cumplicidades
e um arado
soletrar pelos dedos
a vertigem da luz
no sulco dos barcos

até ser dia

 

sexta-feira, 26 de abril de 2013

ETERNOS A PINTAR SOMBRAS




Regressámos ao sítio
onde crescem silvestres buganvílias

foi aí em recato
que rasguei o que julgava ser um poema

lá no cimo da Arrábida
em visita guiada
aos azuis do Sado
no mais íntimo dos silêncios
observei a anatomia
dos teus gestos
quando te revelaste
quase ninfa
a invadir impossíveis
ao alcance dos dedos

ali ficámos eternos
a pintar sombras
que se alumiam

a inventar flores amanhãs e outros relâmpagos

 

sábado, 20 de abril de 2013

ABRIL CHÃO DE CLARIDADES





        Muitos foram os amigos que me brindaram com a sua presença na apresentação pública do meu Chão de Claridades. A todos estou grato - aos presentes e aos que se manifestaram de outro modo.

Transcrevo uma passagem da minha intervenção no encontro

... e foi assim ...
um dia escrevi - o amor é revolucionário e uma senhora que esculpi nas areias da praia, logo se levantou  para me dizer
O amor é revolucionário? Interessante. Importa-se de me explicar mais claramente a sua ideia?
- e eu respondi que sim
Meu amor, nesta ilha rodeada de sonhos, se tivéssemos um barco, ai se tivéssemos um barco, como seria inútil este mar - lutaremos como somos e onde estamos.
A senhora de pé nas areias adiantou que as realidades quando ficcionadas, por vezes são mais verdadeiras - e ainda acrescentou - gostei de o ouvir, só é pena ser comunista.
Olhei-a nos olhos e respondi que não queria salvar o mundo, só ajudar.
A poesia é um prazer para quem escreve, um desafio para quem lê.
Tudo se move, até o vento.
Por vezes um poema vale por um verso e um verso uma eternidade.

A senhora, ainda de pé disse não ter entendido mas que as palavras eram lindas.
... e foi assim...
neste Chão de Claridades, por mares nunca antes desgrenhados que subimos à nossa escarpa preferida para colocar um beijo no mastro mais alto da vida.
Foi preciso mexer na memória das areias, celebrar relâmpagos, sol, pássaros, e algumas pedras com coração por dentro para lhe dizer ao ouvido que os poemas mais bem conseguidos, ainda não foram escritos ... mas vou tentar senhora.


A noite carregava
a sua própria sombra
mas nós carregávamos uma noite
que não era a nossa
quando uma luz de sol
despontou nas paredes do cais
para ergueres as pálpebras
e veres claramente
espalhadas no chão dos barcos
o que pareciam ser
as últimas flores do Inverno

Tu sabias
que estavam a medrar
novas marés
quando subiste à gávea
dos barcos ancorados
para confirmar o rosto branco
da madrugada

Tu sabias
que alguém andava
a lavrar desertos
para nascer uma flor
mais vermelha que os teus lábios


 

segunda-feira, 15 de abril de 2013

CHÃO DE CLARIDADES



                          
                                       
 

    Também eu vos convido para este vagaroso instante.
     Serão todos bem-vindos



 

terça-feira, 9 de abril de 2013

FLOR DE ABRIL






Hoje vi com os meus olhos
uma santa mulher
asfixiar um pássaro
nas mãos
só para desenhar no chão
a dor que sentimos

chamei-a
para deixar nas areias
um beijo côncavo
e permanecer
até a memória arder
os últimos barcos
as algas discernirem
de olhos abertos
todos os ritmos das marés

chamei-a
para esgrimir contra
a invenção dos destinos
erguer o seu corpo
de grânulos
e recolher todos os beijos disponíveis

chamei-a
para acordar o sono
deste chão
libertar os pássaros

vi uma mulher
amada
esculpida na praia

 

domingo, 7 de abril de 2013

A LEVEZA DOS PASSOS






Nunca foi importante
saber se era vento
barco pássaro
mulher incerta
metáfora
ou flor de estação

importante é quando passa

passeia no corpo das searas

evita magoar os cravos

Sempre me apaixonei
pela leveza dos seus passos


 

quarta-feira, 3 de abril de 2013

NA LUZ DAS SOMBRAS






Tão leve de palavras
estava de feição o mar
quando te despojaste
pétala a pétala
até ao mais íntimo da pele

À semelhança dos pássaros
que nidificam em cânticos
na folhagem
nunca será possível
atenuar o grito de uma flor

Tão leve de palavras
renascido um sopro de vento
pegou-te ao colo
para despertares
o baloiço das marés

foi assim

descobrimos na luz das sombras
remos velas  passos

e já foi tanto