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Sempre que o mar
nos bate à porta
povoado de sílabas
só às mãos cheias
ousamos escrever
desprendidos
num abraço de luz
a crescer até às cinzas
Sempre que o mar
nos bate à porta
caminhamos por sobre as águas
no chão da casa
mas à hora da leitura
inocentes
ardem faúlhas
Nem o mar sabia
entardecer
numa folha de papel
esculpir em síntese
a tua nudez
nem o mar sabia responder
a tanto azul
nem eu sabia que tardavas
mas chegavas
chegavas chegavas
nunca mais acabavas de chegar
a tempo de plantar
uma árvore
que se desnudasse
folha a folha
nem tu sabias senhora
neste deserto
a sede do entardecer
o fulgor do porvir
Quando eras um rio
a rasgar caminhos vertiginosos
e as escarpas seguiam
imaculadas os teus olhos
os peixes ficavam encarnados
na tua boca
nidificavam entre margens
enleados
quando a sombra das pontes
nem sequer eram fronteiras
e eu disse que os rios viajam
do ventre até à foz
tu sabias que só o mar
os acolhe
quando eras um rio
eu dava os primeiros passos
na água
a desconstruir muros
silente o chão
se alevanta
Efémera crisálida
despontou silvestre
na mesa do alpendre
onde nidificam os sonhos
quando um passageiro arfar
se desnudou
à vista dos aloendros
flor vertebrada
no mais alto mastro
das marés
soletrou afagos no jardim
à míngua de relâmpagos
e eu só podia fazer o que fiz
inscrever-te para sempre
numa folha de papel
Com olhos cheios de mar
o azul debruçava-se dos céus
para se ver
no espelho das águas
Decantada a essência da luz
ainda fizemos um gesto
acenámos com flores
de jacarandá
mas ao anoitecer
assistimos
por uma côdea de estrelas
à fuga dos barcos