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Quando eras um rio
a rasgar caminhos vertiginosos
as escarpas seguiam
imaculadas os teus olhos
os peixes ficavam vermelhos
na tua boca
nidificavam entre margens
enleados num abraço de limos
quando a sombra das pontes
nem sequer eram fronteiras
e eu disse que os rios viajam
do ventre até à foz
tu sabias que só o mar
os acolhe
quando eras um rio
eu dava os primeiros passos
na água
a desconstruir muros
silente o chão
se alevanta
nas nossas mãos
eufrázio filipe
"Chão de Marés"
No rescaldo de um fósforo
ainda ardiam palavras
por sobre as águas
em viagem
a pensar por todos os póros
revi-te apócrifa
a tecer um pássaro
nos meus dedos
pequenos amplos gestos
no velho cais
contra todos os destinos
e se tivéssemos um barco
seria inútil
eufrázio filipe
No regresso à velha casa
respirámos fundo
nas paredes do cais
lá estavam organizados
numa pauta de sons
silvos sulcos lábios
timbres no desassossego das marés
a desvendar como se movem
águas margens sonhos
No regresso à velha casa
beijámos pedras sedimentos
soltámos os barcos
e partimos
eufrázio filipe
Como se fôssemos livres
e somos
para lá dos limites
num traço a pulso
esculpido no pomar das marés
dormem anjos
a fingir de pássaros
desenham barcos
para que tudo aconteça
passo a passo
por sobre as águas
respiram pelas narinas do vento
incansáveis
sopram contra o vento
prisioneiros do sonho
eufrázio filipe
(revisitado)
Em 1974 Freitas do Amaral disse que não era um democrata.
Discípulo do regime da ditadura, fundador do CDS votou contra a Constituição após o 25 de Abril.
Recuperado pelo PS há quem lhe chame hoje, no dia da sua morte, um fundador da democracia.
O futuro pode ser surpreendente quando se tentam branquear memórias.
Paz à sua alma