quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

CAMINHAR NA ÁGUA




Imaculada a noite

que nunca dorme

no sossego da preia-mar



Talvez por isso

te veja à tona

arredondada no manto do leito

com um andar baloiço

quase ninfa

púrpura

navio

rio acima a despontar faúlhas



Imaculada a noite

que não dorme

nesta branda tempestade

transporta no teu corpo

um sinal

de cores lúcidas

sedento de madrugadas



Estou a ver-te

asa flamejante

a rasgar um clarão de azuis

sonhos e amanhãs



a entrar efémera no poema

rio acima

dissonante



Meu amor

minha noite de alvoradas



como é bom caminhar

na água

pelos nossos pés




segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

O AROMA DO TRIGO










A CANTAR

METIAS NOS PÚCAROS

UMA FEIRA DE BARRO

DESAPERCEBIDA DO SÍTIO

ONDE SE GERA

A METAMORFOSE DOS SONHOS

ONDE TODO O ESPAÇO

É EXÍGUO



AQUI JÁ NEM A CHUVA

SE QUEBRA NO VAZIO

MAS TU VENS

SOPRAR AS PALAVRAS

ATEAR NOVAS FOGUEIRAS



AQUI JÁ QUASE

NÃO HÁ ESPAÇO

PARA CANTAR

MAS TU VENS

BEBER ESTE CHÃO

ÀS MÃOS CHEIAS



RECONHEÇO-ME NA SUBSTÂNCIA

DE QUE SÃO FEITOS OS SONHOS

NO AROMA DO TRIGO

QUE TRAZES NA BOCA






sábado, 23 de fevereiro de 2008

EM PLENO VOO


Floriram pedras cordas de guitarras e violinos
as vozes dos pássaros
bordaram cantigas de linho

mas os barcos
romperam auroras
com gritos sonâmbulos

Talvez por isso
o mar remasse melhor os nossos barcos
se a madrugada
fosse uma noite
de lua cheia
e consentisse naufragos

talvez o mar remasse melhor
esta branda tempestade
no amor incontido de florir
em pleno voo

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

ISTO NÃO PODE CONTINUAR ASSIM

ZÉ POVINHO - MUSEU

Somos a nação mais antiga da europa,
o país mais feliz do mundo e o povo mais ingrato.
A nação mais antiga porque somos - basta
contar pelos dedos e consultar os anais da história.
O país mais feliz a cantar o fado e a gritar
no futebol,sem problemas étnicos nem de fronteiras
de pele ou religião.O povo mais ingrato - porque
sendo proprietários falidos não deixamos de ser
proprietários endividados,mas proprietários
com o crédito das "nossas" casas,dos "nossos" carros
dos "nossos" telemóveis.Ingratos porque não agradecemos nada a ninguem,só pedimos
a Sócrates,a Fátima,a Deus,à República,
aos Sindicatos e à Liberdade.
Meu povo - isto não pode continuar assim.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

OUTROS AMANHÃS



O sangue mordido
pulsa nas marés
conforme as noites
ancoradas na cidade
e os barcos soltos
no chão das escarpas
desalinham adormecidos
na água
ao sabor dos limos

respiram por guelras

Apesar de tudo cantamos
nesta noite de brumas
sem repouso
sem limites
como o ar que se respira
a si próprio

Hoje despojámo-nos da cidade
para escutar o som
de outras falas
a fímbria do mar
a rasgar-se em clarões
de espumas

outros amanhãs

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

A LEVEZA DAS CINZAS








A manhã

num grito de alvorada

desperta no teu corpo

o som dos pássaros

e as pedras medram

porque são seixos

ungidos pelo mar



a manhã

respira,arfa,espuma

por todos os póros

até que a sombra

cansada

se ateie

até ser outro dia



Pudesse dar ás palavras

a leveza das cinzas

já esta fogueira

ardia

nos nossos passos




sábado, 9 de fevereiro de 2008

QUE FIZESTE DAS NOSSAS FLORES?

Mário Nagamura






As árvores viajam

na sombra do verde

um sussurro de folhas

e tu foges dos ramos



amanheces tão distante

que nem os meus olhos

descobrem os teus gestos



As árvores viajam

onde acontece a cor do fruto

no chão

e os pássaros sem amos

deixam que a sombra

se rebente



Meu povo

que fizeste das nossas flores?






quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

UM RISCO NO AR


Vincent Van Goug




Quando as árvores se inspiram


soltam pássaros


que poisam no nosso olhar





É como respirar um sopro de silêncio


nos teus lábios


e só depois ver desaguar


um rio lento





Quando as árvores se inspiram


soltam folhas faúlhas e asas


que os olhos lambem devagar





É como fazer um risco no ar


e só depois reconhecer


o fio de seda que resiste ao vento


contra o vento


segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

SÓCRATES NUM BAILE DE MÁSCARAS






Sócrates parece interessado em esconder-se

do primeiro ministro,enquanto este parece interessado

em ser vítima de Sócrates e assim distrair a opinião

pública perante ataques,que no entender dos dois,

não valem um chavo.

Sócrates - alegre - tenta criar oportunidades

para novos fôlegos,outras remodelações,

como se um primeiro ministro fosse um corpo

impune à farda de que foi investido.

Neste carnaval,pré-eleitoral,Sócrates baila

num baile cansado,a trocar o passo

ao primeiro ministro.