domingo, 30 de setembro de 2007

O COWBOY DA MEIA NOITE


A NÃO PERDER ATÉ AO PRÓXIMO ASSALTO


sexta-feira, 28 de setembro de 2007

PÁTRIA DE SALIVAS

sea-moon






Regressei às águas deste mar

a este movimento de sussuros



a estas redes a este canto

a esta doce sinfonia



a este porto a esta casa desgrenhada

a esta pátria de salivas



Regressei com mãos cheias de sede

para carregar melhor este espelho

flamejante de barcos e tremulina



o corpo líquido por entre os dedos



a síntese da tua nudez








segunda-feira, 24 de setembro de 2007

A SENHORA DAS MEIAS PRETAS

imagem da net












Ao som do Gregorian Chant,no Monostery of Montserrat,estava eu


no c.d.,a ver na minha frente - cairem aves do céu - que mais me


pareciam estrelas.


Na verdade estão sempre a cair aves neste chão que as





fe - cunda


re - colhe


se - pulta





Na verdade neste chão de asas e mares desgrenhados





flutuamos





tão leves que nem a morte sente os nossos passos.





- Cão de barro?


- Perdão - as estrelas também se conquistam - mesmo as que caem do céu.Foi precisamente por isso que decidi apaixonar-me pelo seu cão de barro.


-Decidiu?


- Sabe - até para amar é preciso ser competente e tomar decisões.


É verdade decidi apaixonar-me pelo seu cão de barro e solicitar a sua


presença no meu gabinete de trabalho.Acredite que tenho necessidade


de partilhar o poder no meu último despacho.


Especulei com a memória e recordei uma história inventada


"Sim senhora ministra".





Uma vez mais a lua estava cheia e um vulto elegantíssimo percorria


a azinhaga desde o portão até à casa.


Obviamente o portão estava no trinco e o cão preso.


O Dique - observador de silêncios gregorianos - permitiu que o vulto


se aproximasse - mas não deixou de roer a corda.


No chão da azinhaga - um som cadenciado - uma espécie de toc-toc


toc-toc na direção da casa.


Agora sim mais nitidamente,o vulto parecia um espaço habitável,


uma mistura de sombras eróticas.


Exibia quase provocadora um caminhar de ancas sofisticado


e o clássico aroma do chanel nº.5.


- Senhor - não é um assalto.Tomei a liberdade de invadir pacificamente o seu espaço para lhe fazer um convite personalizado.


- Foi um risco senhora.Aqui quem morde é o dono.





No dia e religiosamente na hora - lá estava eu com o meu cão de barro,no seu faustoso gabinete de trabalho.





Decidida - varreu para o chão toda a papelada,arquivada à vista


na larga mesa de reuniões.


Colocou na aparelhagem um c.d. e o reóstato no lusco-fusco.


Pegou docemente no dique.Subiram para o tampo da mesa e aí


dançaram soltos,como estrelas,cabeças a tilintarem nos cristais


do lustre.





Exausta - largou o cão e convidou-me para um moscatel roxo.


Sentada no sofá,saias arregaçadas,colocou uma bela caneta


de tinta permanente,cravejada de brilhantes e aparo de ouro legal -

entre os dedos do pé direito e assinou devagar mas com determinação

o seu último despacho oficial.



-" A partir de hoje - sou a senhora das meias pretas."







quarta-feira, 19 de setembro de 2007

O CÃO É CEGO






Nesta vida que ladra,há um chão de latidos que por vezes nos roi

os ossos e morde o silêncio - se nos calarmos.


Nesta vida onde todos os muros parecem ter uma fenda e os amantes

bem podiam ser pais eternos e namorados.


Nesta vida onde se reproduzem "os filhos dos homens que nunca foram meninos" e mulheres que nunca foram estrelas - apetece-me

continuar a dizer bem alto - plantai árvores crianças.


De facto estávamos no tempo em que todas as histórias eram

mentiras,excepto as inventadas.

Olhos postos na minha araucária preferida - precisamente esta

aqui na minha frente e que ajudei a criar - fixei-me no Dique,

omeu cão de barro.

Na verdade o Dique,após ter sido considerado família,perdeu

a noção do barro,passou a ser cúmplice de memórias e amanhãs.

Nesta atmosfera e talvez a propósito das trovoadas secas que proliferam no tempo que faz,o Dique - completamente solto,confidenciou-me esta história que não resisto a contar,

na presença insuspeita da minha araucária.


O Dique - que nunca gostou de fardas nem de paradas,foi desde

sempre anti-militarista.

Contraditório - já o ouvi defender - guerra à guerra,num conflito

muito grave,quase passional,com a gata da vizinha.

Diferenciava a guerra das palavras,do cheiro a pólvora.


Cão é cão - pensei sem pestanejar.


De qualquer modo afirmava que o poder das armas,nunca foi porporcional à razão dos que as não têm.


Cão é cão - pensei de novo.


A araucária - formosa mas fustigada pelo tempo que faz

e pela história do Dique - não dizia nada,mas atenta aos relâmpagos

de quando em vez lá deixava cair um sinal de pétalas.


Foi num destes instantes que o meu cão revelou a possibilidade

de desalinhar das campanhas bélicas,por via pacífica.

Convocado - apresentou-se de atestado médico em riste,sempre

com a inabalável convicção que uma miopia avançada nunca poderia

resultar num bom artilheiro.

Enganou-se.Os cães ,mesmo os de barro,também se enganam.

Apurado para todo o serviço militar,lá foi a ganir para a instrução,

mas ainda com um brilho nos olhos.


Nos primeiros exercícios físicos,sentou-se a meio do trampolim,

ameaçou deitar todos abaixo no pórtico e no tiro ao alvo apenas acertou

nas tabuletas indicativas.


Exibiu-se como lhe convinha - um verdadeiro soldado de merda,

mas um cão com objetivos - pensei eu de novo.


Um dia e após tanta inaptidão demonstrada,foi convocado

para uma junta médica.

Alguém de bastão apontou uma letra no quadro,tamanho da parede

e perguntou-lhe com voz rouca.


-Que letra é esta?

-Desculpe meu sargento mas não vejo o quadro.


Após uma eternidade de análises políticas e discussões clínicas

o obviamente impoluto colégio militar concluiu por unanimidade


O cão é cego.





sábado, 15 de setembro de 2007

A NUDEZ DOS LÁBIOS

"Bocage e as ninfas"oleo de Fernando Santos








Também aqui o irrepetível espelho



se revela em florações liquefeitas



caminhando como nós por sobre as pedras



enquanto nos olhos da velha araucária



sabe-se lá porquê



uma ave de outras bandas



descarnou aquela que julgava ser



a última pétala da marginal





Também aqui as árvores teimam



projectar sombra



no tracejado solar das marés



enquanto um frémito cintilante



nos dá alento para surpreender



a nudez do primeiro orgasmo





precisamente onde a água se abandona





para os lábios






terça-feira, 11 de setembro de 2007

AVANTE BUBISTA

foto da net



Tenho a vaga ideia de ter sido há mais de cem anos,mas admito

que seja um exagero.

Éramos todos muito mais novos e o sol raiava.

Estávamos reunidos por nobres causas de cooperação no seu gabinete e sonhávamos alto de olhos abertos,renovávamos marés,remávamos ventos de areia,contra a corrente.

Sonhávamos o lento caminhar das dunas e as dunas moviam-se.


Recordo que o encontro foi longo e fraterno,tendo o anfitrião

a dado momento interrompido o diálogo para gentilmente pegar

no cinzeiro,atafulhado de beatas,abrir a janela do gabinete e libertar-nos

das cinzas.

Ficámos mais aliviados - até hoje.


Encontrei de novo o senhor chefe de gabinete do ministro -

hoje ministro.Estávamos como há mais de cem anos no mesmo

restaurante.Mesas quase geminadas,mas de costas um para o outro.


A ilha permanece um ponto no colossal mapa do Atlântico.

Pobre mas bela e selvagem - uma deusa para amar a tempo inteiro.

A ilha bordejava de brancas areias delicadas onde ainda corajosas

nidificam tartarugas,supostamente protegidas.

Idílico espaço árido que alguns habitam,na sonolência cálida

e transparente das águas com vista para pequenos rebanhos

de cabras à solta.

O turismo vai adocicando a vida dura,mas não disfarça

as dificuldades impostas.

A ilha permanece ainda uma dádiva da natureza,mas cada vez mais

para invasores por via pacífica,enquanto o povo,na sua terra,

continua a ser uma maternidade para a emigração.


Mais de cem anos volvidos - não fui reconhecido pelo ex-chefe

de gabinete do senhor ministro,talvez por estar previsto para mais tarde

um encontro.

De qualquer modo ele estava ali - mas de costas e distraído e eu só tinha uma possibilidade - olhar de soslaio e fixar-me numa bela duna

aloirada que espreitava,não muito longe,o nosso silêncio.

Foi o que fiz.Fixei-me na duna.


Entretanto e para dilatar o tempo,pedi ao empregado uma sobremesa.

Disse-me que só tinha bolo.

Perguntei - bolo de quê?

Só bolo.


Concordei no preciso momento que o senhor ministro revelava

em surdina um despacho relativo à minha presença na ilha.


"Considero não ver inconvenientes na cooperação,mas as minhas

expectativas estão muito por baixo"


Recordei-me da sua gentileza quando era chefe de gabinete e do

mesmo modo como compreendi o empregado de mesa,não compreendi o ministro.


Passado que foi o período do repasto - faltei ao encontro.

Dirigi-me à duna - e lá do alto dei um grito em crioulo.

AVANTE BUBISTA

Atirei um grão de areia ao poder.Condecorei a senhora da limpeza

com a medalha destinada ao ministro e deste modo


obviamente que o demiti.





segunda-feira, 10 de setembro de 2007

ESTRELA DO MAR

foto da net








Admito que estejas sentada

nas areias da praia

à espera da onda

onde me espumo



para te colher



Se lá não estiveres

no teu lugar estará um sinal



e nada mais será importante



estrela do mar


quinta-feira, 6 de setembro de 2007

LUCIANO PAVAROTTI






















No silêncio





ecoa





mar adentro





arde em chamas





nas falésias





o branco do linho












terça-feira, 4 de setembro de 2007

O FIO DA MEADA ( 3 )

Embarquei num aeroporto sem radares
e cheguei numa avioneta com ventoinhas.

O dia estava pardo na Terceira

No taxi perguntei ao motorista,perante uma senhora
de Fátima que balouçava ,pálida e por um fio
no retrovisor:

Foi na "Casa das Tias" - aqui nesta ilha - que nasceu
Vitorino Nemésio?
Sou de cá mas estive vinte anos na américa.Não lhe sei responder
- isso é mais para políticos e doutores.

Assim esclarecido fui ver a velha casa,que serviu em tempos
para armazem de refrigerantes e hoje é museu municipal.

Na terra de Vitorino Nemésio
e do porta aviões americano das Lages
alguem entendeu por bem que a vida
não é apenas o minuto que se segue.

Acabei por reconhecer
que ainda por algum tempo
fará "mau tempo no canal"

domingo, 2 de setembro de 2007

FESTA DO AVANTE








No Seixal

o P.C.P. entendeu por bem partilhar

o seu belo espaço debruçado sobre o Tejo

com todas as pessoas



Um momento sem complexos

de lapelas partidárias



No respeito pela diferença

admito que também em festa popular

é possivel

na multiplicidade das ofertas culturais



construir amanhãs