Nesta ilha de náufragos e jangadas imperfeitas as romãs abriam os lábios explodiam multidões. Os cães adivinhavam o brilho dos relâmpagos e tu caías abrupta nos meus braços.
Quando te ouvi assim a cair dos céus, desamparada a lubrificar a terra, não sabia o teu nome, muito menos como te beijar os pés.
Quando te vi assim pendente, incolor, nua de tudo, chamei-te um nome qualquer e tu chegaste a cântaros, tão líquida por entre os dedos.
Recebi-te quase ninfa, de braços abertos na minha escarpa e assim ficámos vagarosos instantes a respirar eternidades.
Ainda hoje não sei quem és senhora.
Trazias nos cabelos um mar desgrenhado a derramar estrelas em cânticos sibilinos, barcos do outro lado do cais.
Fiquei sem saber se existias de facto ou teria sido eu a inventar-te.
Escancarei as janelas, acendi um fósforo no alpendre da casa, e tu lá estavas a cair dos céus, sem muros nem ameias, a cantar.
Visitavas museus, sombras de luz mas não eras simpatizante da luta de classes. Tinhas um Cristo crucificado nos olhos, uma vontade serena de liberdade, uma biblioteca onde se destacam textos apócrifos mas também vivificam Jorge Amado, Soeiro Pereira Gomes.
Se tivesse que te desenhar faria um gesto, um risco a carvão no ar que respiramos, bebia-te às mãos cheias e partia até ao fim do voo inventado, mas deixaria na tua árvore preferida uma romã.
37 comentários:
Até as romãs que não andam à chuva, podem molhar-se!...
Abraço
Bela e liquida a prosa que se bebe como se de poesia se tratasse.
Abraço
Tenho que fazer alguma coisa com "isto", de forma a que leia repetidamente o que escreveste
É belo demais para que fique ausente...
Nossa!!! lindo lindo lindo... fui lendo rapido para ver como terminava e ao terminar quis voltar a ler... maravilhoso poema...
belo...acho que o melhor do melhor do que já li teu .
:)
Não sei se é da chuva que fala, se é das romãs que se desfazem em sangue, se são apenas palavras que ficam a escorrer dentro de nós.
Muito bonito.
Belas as palavras!
Continuação de bons escritos.
Sorriso
Uma "romã" linda e esclarecida.
Abraço,
mário
Linda esta prosa poética.
Um abraço
Intensamente belo :)
Muito muito belo! Obrigada
Bom fim de semana
Um daqueles raros poemas
que nos captura e paralisa
em minutos eternizados
de magnitude poética...
Gostei muitíssimo!
Quereria ser menos banal neste comentário, mas... gostei demasiado para poder fazer uma análise objectiva.
Abraço!
"vagarosos instantes a respirar eternidades." assim fiquei, ao lê-lo...
Beijo
Extasiada...
"a respirar eternidades."
Belíssimo!
Beijo carinhoso, poeta!
Intensa e apaixonante sua poesia.
Água purificadora que abençôa a vida e a poesia. Um texto mágico, de tanta beleza que encerra.
Deixo-lhe o meu abraço!
Texto poético para o qual não existem palavras que possam comentar, tal a sua dimensão!
Li, reli e refecti. A única coisa que me ocorre dizer é que o fruto escolhido para deixar na árvore preferida dessa Musa, sublima tudo o que foi escrito, já que a romã simboliza a paixão e a fecundidade...
Muito, muito belo!
Um abraço!
Nada, aqui, me obriga à significação.
Este é de comer, alimento dos "esfomeados de sonho" como diria Natália Correia.
Um beijo
Estimada Lídia
grato pela memória da nossa Natália
com quem partilhei longas viagens
Bjs
A água que fecunda, a chuva que tudo lava(?), o sonho que alimenta, a prosa feita poesia.
Abraço.
Volto para "reclamar" :)
E que para ficar tua seguidora temos que descer ao rés-do-chão.
Beijinho.
Estimada GL
Não entendi a mensagem
Aqui na escarpa escrevo à mão
quase nada sei de máquinas
fusível é alta tecnologia
Bjs tantos
Muito bem!
Passo a explicar.
Há bastante tempo que queria ficar Seguidora do MAR ARÁVEL, mas onde estavam os Seguidores?
Hoje decidi pesquisar melhor e?...
E, eis senão quando, encontro os ditos mesmo no final da página, ou seja no "rés-do-chão".
Resumindo. Após estas diligências, vou, finalmente, ficar por aqui!
Beijinho.
P.S. O MAR ARÁVEL já está na minha lista de blogues que estou a seguir.
há fomes assim: que que se incendeiam no rosto líquido de um nome qualquer.
como bagos de romã - colhidos bago a bago...
Abraço, Poeta maior
Belíssimo texto para receber a chuva de braços abertos!Ah! E a romã que se abre e se mostra cheia...linda...sumarenta!
Um abraço.
M. Emília
Fico com o comentário da Lídia _ o poeta é esse uivo esse instantâneo de coisas 'uma imprudência a mesa posta'... estou a degustar...
parabéns
Inquietações, dúvidas...é a vida resumida numa romã.
Lindo!
beijinhos
Uma infrutescência que nos lava a alma.
Abraço
Olinda
eu gosto dos barcos do outro lado do cais
e dos novembro-romã
um abraço
Fabuloso poema repleto de belíssimas metáforas que me prenderam aqui por alguns instantes. Bj Ailime
A romã é dos mais belos frutos que que existe, tal como o seu texto a transbordar uma poesia que apetece comer.
Soube-me tão bem!
xx
Mar Arável,
A Romã é uma fruta muito estético. Eternizou-a.
Beijinho. :))
Eu também gosto muito dos
Novembro Mágicos e de Romãs.
E do que escreve.
Bj.
Irene Alves
Pode ser o fruto do paraíso, a romã. É aquele que o poeta quiser.
Magistal este e os outros textos..
Abraço enorme...
:)
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