quarta-feira, 26 de maio de 2010

OS DIAS CONTADOS PELOS DEDOS



Parecia que a chuva estava cansada
de cair neste chão
muito antes de rebentar a sombra
das videiras

mas de tanto azul
no outro lado da serra
ainda há mar bastante
mais que céu
para as aves circularem livres
nas nossas mãos 

Cúmplices sabíamos que a água
não caía dos teus olhos 
nem dos meus 
nem do rumor das fontes 
nem dos céus vertiginosos 

tão só 
caía 

Sabíamos que um dia ía chover
na escarpa onde nos despimos
sem esquinas nem becos

só não sabíamos os acordes 
das maresias 
para merecermos os nossos lábios 
os dias contados pelos dedos 

31 comentários:

hfm disse...

Há acordes que nunca se sabem, que se criam, que se perdem, que se buscam e que se descobrem. Belíssimo!

São disse...

Gosto sempre dos teus poemas, mas deste gostei ainda mais.

Um abraço, amigo.

antonio ganhão disse...

Existem lágrimas assim, desprendem-se e é tudo.

luis lourenço disse...

cheira a mar...sendo campestre...
Belo com dimensão telúrica da tua encosta.

Abraço,

Véu de Maya

Breve Leonardo disse...

[como preces para os cursos da natureza, que se desfaz e recompõe nas próprias palavras]

um imenso abraço

Leonardo B.

© Maria Manuel disse...

memória de encontros amorosos, de uma sede a que nunca faltou a água que "tão só/ caía". belo!

abraço.

lino disse...

Palavras para quê se já está tudo dito?
Abraço

jrd disse...

Mais um poema liquido.
Muito bom
Abraço

maré disse...

quando contávamos os dias
nos rumores das marés
para prevenir o fro dos Invernos
ainda não sabiamos que as aves
circulam sempre
ainda que as nossas mãos antecipem
a rebentação das sombras.

só mais tarde soubémos que o mar
é o destino de céus vertiginosos.

_

beijos Eufrázio

Sebastiano Landro disse...

Felicitciones por el post y un saludo!

José Carlos Brandão disse...

"muito antes de rebentar a sombra
das videiras" - bonito isto. É quando a linguagem se esquece de dizer alguma coisa, e faz só poesia.

anamar disse...

No teu dom de poemar
Só te quero dizer que estive por aqui... a ler-te.
:))

Virgínia do Carmo disse...

Há chuvas que chegam de céus que o próprio céu desconhece...

Gostei muito deste poema, mas na verdade... gosto de todos os poemas "aráveis"...

Abraço

Graça Pires disse...

Conto pelos dedos o tempo de entardecer cansaços. E chegou-me aqui o cheiro da maresia e a magia das palavras.
Um belo poema!
Um beijo, amigo.

Licínia Quitério disse...

Lindíssimo. Doce-amargo, com uma linha azul a circundar os lábios, os dedos...

Non je ne regrette rien: Ediney Santana disse...

"Cúmplices sabíamos que a água
não caía dos teus olhos
nem dos meus
" versos para um delicado encontro

partilha de silêncios disse...

Por vezes a vida nos leva a contar os dias pelos dedos !!!

bjs

Anónimo disse...

momentos que assim contados são mais bonitos de recordar. um beijinho, eufrázio.

M(im) disse...

E quando acabam os dedos das duas mãos? Podemos contar.... com os da alma?

Gabriela Rocha Martins disse...

sabíamos
e
isso já e[ra] suficiente




.
um beijo

Fá menor disse...

Quando não sabemos os acordes
em vão se dedilham as cordas da viola,
os acordes que soam são imperfeitos.

Bjos

Tania regina Contreiras disse...

Poema d'água...belo. Obrigada pela visita à Casa da Imaginação.

Abraços,
Tânia

ana disse...

O que me trouxe aqui foi esta frase que li no Guizo e o Gato: "Infinitésimo é o pensamento". Numa frase conseguiu dizer tudo. Fantástico.
Gostei do seu poema e do nome do seu blogue. O mar, imenso mar exerceu e exerce uma atracção enorme de coragem, de medo e infinitude.
Se me deixar colocarei o seu poema no meu blogue porque gostei, e é tão simples como isto!
Passarei para saber se autoriza.
Desculpe entrar sem bater à porta.
:)

Justine disse...

Segui o curso de água dos teus versos - cheguei ao fim dos dias.

Mª João C.Martins disse...

E correm rios e marés e nós, caravelas sem mastro..

Um abraço

mdsol disse...

Como os comentários já vão longe fico-me por um: gostei!


:)))

Sara disse...

Contar pelos dedos ou... confiar que, depois da chuva, teremos a sombra das videiras.

Adriana Riess Karnal disse...

gosto dessa metáfora do tempo incrustado no corpo...lind!

Mel de Carvalho disse...

É a palavra, a palavra que, sempre maior, se entre_laça na sombra das videiras em pousio, germinativa, néctar, canto, hino.

Belíssimo.

Grata pela partilha
Mel

Anónimo disse...

Chegar... partir
Regressar ao ninho
Pé ante pé...
Escutar contigo
o mesmo búzio
Falar com os mesmos cães
na tua escarpa
"para evitar
o suicídio"
para lá dos silêncios.

princesa

tb disse...

Belíssimo!