sábado, 28 de setembro de 2013

A PROFANAÇÃO DAS METÁFORAS




                                          "A profanação das metáforas"
                                                                (publicado em 1994)



Desprendemos os céus de todas as preces
regressámos às dunas sibilinas
alados azuis milenares
e começámos a escrever em liberdade
verdades improváveis


 

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

JANGADA



                                               "Mar Arável"   1988



Minha jangada disponível para os lábios

porque reúnes tantas claridades?
e te entregas quase ilegível ao poema?

porque te espantas florida de pequenos nadas?

porque rebentas coração e te transportas?

porque finges ser jangada?


 

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

ANTÓNIO RAMOS ROSA





Morreu hoje um grande Homem
o poeta da luz interior

Não deixemos morrer
os nossos mortos

 

sábado, 21 de setembro de 2013

GUARDA-RIOS






Livres
na placidez exuberante
livres
nas margens de tudo
sequestrados no paraíso
por relâmpagos
que nunca mais chegam
agitam inocentes
águas doces
em busca de uma luz
na sombra das pontes

quedam-se nos apeadeiros do rio
sussurram aladas
lágrimas correntes
num choro compulsivo

Nas margens de tudo
há um barco
que rema
os seus olhos

 

domingo, 15 de setembro de 2013

NO PULMÃO DAS MARÉS






Neste porto desobrigado de fronteiras
e outros céus
vem à tona a energia imperecível
dos desertos
o perfil escarpado da luz
fragmentos de círculo

Nesta apoteose de neblinas
defino a brancura do teu corpo
de pátria movediça
como um prado onde refulgem
transfigurações de barcos
rumores de outros mares

Amo esta janela com vista para o vento
onde é possível ser eterno
por um instante
povoar o silêncio errante das metáforas
e viver apaixonado
no pulmão das marés


 

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A REMAR AS ÁGUAS






Sei que lanças pedras
com vida por dentro
para acordar os pássaros
escreves palavras
mais leves que as cinzas

sei-te encantatória
vertebrada
passo a passo
à vista das margens
a sulcar o rio

só não sei
porque te desnudas
nos olhos da folhagem
a remar as águas

 

terça-feira, 3 de setembro de 2013

NOS LÁBIOS DA AREIA



                                     desenho de ÁLVARO CUNHAL


Ao entardecer
um bando de pássaros
desenhou
na palma das nossas mãos
uma vida inteira

e tudo parecia
mais azul que os céus

No seu linguajar
mais alto que o voo
duas linhas paralelas aconteceram
prolongadas paralelas
que se encontram
aonde os olhos não mentem

Ao fim da tarde
tudo é mais claro

até a noite cheia
nos lábios da areia