quarta-feira, 25 de junho de 2014

INOCENTES ARDEM FAÚLHAS







Sempre que o mar
nos bate à porta
povoado de sílabas
só às mãos cheias
ousamos escrever
desprendidos
num abraço de luz
a crescer até às cinzas

Sempre que o mar
nos bate à porta
caminhamos por sobre as águas
no chão da casa

mas à hora da leitura
inocentes
ardem faúlhas


 

sexta-feira, 20 de junho de 2014

O FULGOR DO PORVIR







Nem o mar sabia
entardecer
numa folha de papel

esculpir em síntese
a tua nudez

nem o mar sabia responder
a tanto azul
nem eu sabia que tardavas
mas chegavas
chegavas chegavas
nunca mais acabavas de chegar
a tempo de plantar
uma árvore
que se desnudasse
folha a folha

nem tu sabias senhora
neste deserto
a sede do entardecer

o fulgor do porvir



 

sábado, 14 de junho de 2014

SILENTE O CHÃO SE ALEVANTA







Quando eras um rio
a rasgar caminhos vertiginosos
e as escarpas seguiam
imaculadas os teus olhos
os peixes ficavam encarnados
na tua boca
nidificavam entre margens
enleados

quando a sombra das pontes
nem sequer eram fronteiras
e eu disse que os rios viajam
do ventre até à foz
tu sabias que só o mar
os acolhe

quando eras um rio
eu dava os primeiros passos
na água

a desconstruir muros
silente o chão
se alevanta


 

sábado, 7 de junho de 2014

À MÍNGUA DE RELÂMPAGOS








Efémera crisálida
despontou silvestre
na mesa do alpendre
onde nidificam os sonhos
quando um passageiro arfar
se desnudou
à vista dos aloendros
flor vertebrada
no mais alto mastro
das marés
soletrou afagos no jardim
à míngua de relâmpagos

e eu só podia fazer o que fiz

inscrever-te para sempre
numa folha de papel

 

segunda-feira, 2 de junho de 2014

A FUGA DOS BARCOS







Com olhos cheios de mar
o azul debruçava-se dos céus
para se ver
no espelho das águas

Decantada a essência da luz
ainda fizemos um gesto
acenámos com flores
de jacarandá

mas ao anoitecer
assistimos
por uma côdea de estrelas
à fuga dos barcos