sexta-feira, 30 de maio de 2008

OS TEMPOS MUDAM COM SÓCRATES ?

AGRADEÇO AO PUMA ESTA IMAGEM

segunda-feira, 26 de maio de 2008

MEMÓRIA TATUADA

Le premier jour




Acordei assim

a fazer versos

ou quase nada



na memória tatuada



aqui

onde pastamos com os animais

um rumor de plantas

aqui

onde as línguas mergulham

na saliva das palavras

e se consomem em cânticos

até às cinzas

aqui

onde cuspimos no ar

uma povoação de sílabas

que fazem falta

para esculpir uma pedra

que fale por gestos

aqui

prenhes de ventos

fresquíssimos

nas bocas abertas

onde respiramos

outras madrugadas



Acordei assim

a fazer versos

ou quase nada



na memória tatuada

aqui

onde o deserto e a sede

têm uma janela aberta

um eco silvestre

que nos bate à porta

para ouvir e gritar



aqui

onde tu dançavas

eu fingia tocar violino

e o mundo acordava



sábado, 24 de maio de 2008

CEGUINHO É O CÃO



Porque a vida não é só poesia

e milhares de portugueses quando se sentam

à mesa não comem metáforas com palavras

indizíveis,é preciso acordar o chão que pisamos

enquanto os pássaros aparentemente livres

sonham e o mar cumpre o seu destino.

Tudo isto porque no parlamento nacional

o governo - uma vez mais - se regosijou

com números e percentagens que abrilhantou

a seu modo,em contraste com o país real

que os olhos veem.

Um dos números engalanados com o sorriso

dos mandantes é o da baixa do desemprego.

O que os olhos veem são 427 mil desempregados

e a falácia dos números do governo

que não considerou o aumento da emigração

nacional,os falsos recibos verdes,o trabalho

precário que só nos últimos três meses subiu 11%.

Os números do governo não consideram

os 75 mil novos desempregados,classificados

segundo o INE como inactivos.

Tenta a maioria esmagadora adocicar a crise

profunda e generalizada com migalhas.

Promissor é o grito do cego a quem Sócrates

deu uma esmola.

- Só isto? Ceguinho é o cão.


domingo, 18 de maio de 2008

LÁBIOS

Pitura ROYO




Demoras-te senhora nestas águas

porque é sempre breve

o instante

das pequenas vertigens



Vieste colher os meus lábios

para incendiar uma pedra



Na verdade o teu corpo

tão líquido e incerto

na voragem dos destinos inventados

vibra no ritmo das marés

ilumina-se por dentro

num feixe de faúlhas



habita as fendas rema

por onde espumam as salivas



Demoras-te senhora nestas águas

sentada no meu barco



mas nunca saberás

dos meus lábios uma palavra

sempre que tocar os teus



nem das línguas

o fogo regurgitado

que nos liberta




terça-feira, 13 de maio de 2008

SEM BARCOS NEM AMEIAS





Nesta ilha rodeada de sonhos

lutaremos como somos

onde estamos


Ouvidos colados

neste chão de areias

até as searas renascidas

em festa de timbres

respiram fundo a intimidade

da terra lavrada


O nosso lugar é a partir daqui

na combustão de cada instante

porque este mar precisa

ser fecundado

às mãos cheias

na aragem limpa

por cima dos horizontes


Nesta ilha esta água

precisa de gestos simples

e um arado


só então será de beber

ou corpo de mulher


Nesta ilha meu amor

o nosso lugar é aqui

na vibração táctil do lume

na luta que tempera

frutos lentos

sem ameias


e se tivéssemos um barco

ai se tivéssemos um barco


como seria inútil

este mar

quarta-feira, 7 de maio de 2008

CAVALGAR O VENTO






Estas ondas navegáveis

sempre a chegarem e a partirem

seguem o itinerário minucioso

que resiste

ao despontar das marés



precisamente



no silêncio

onde melhor se ouve Tchaikovsky

desmaiam dunas

e nidificam os sonhos



Chegávamos e partíamos

como se as mãos apenas servissem

para dar de beber às fontes



Chegávamos e partíamos

asas soltas na sombra dos barcos

descontentes mas cantávamos

músicas fundas erguidas

tão limpas de areias



Na intermitência do tempo

onde desaguam submersos outros poentes

cavalgamos o vento

para a água seguir

os nossos passos




sábado, 3 de maio de 2008

ÁGUAS LENTAS








Neste rio correm memórias

por um fio



tão lentas as águas

que apenas soletro

os silêncios que ladram

nas margens deste barco



lentas mas breves estas águas

quebradas no olhar

nas arestas do vento

antes que ardam

os pássaros na folhagem



ou sacudam o corpo

para o mar