segunda-feira, 22 de abril de 2019

FLOR DA ABRIL






Hoje vi com os meus olhos
uma santa mulher
asfixiar um pássaro
nas mãos
só para desenhar no chão
a dor que sentimos

Chamei-a
para deixar nas areias 
um beijo côncavo
e permanecer
até a memória arder
os últimos barcos
as algas discernirem
de olhos abertos
todos os ritmos das marés

Chamei-a
para esgrimir contra
a invenção dos destinos
erguer o seu corpo
de grânulos
e recolher todos os beijos disponíveis

Chamei-a
para acordar o sono
deste chão
libertar os pássaros

Vi uma mulher
amada
esculpida na praia
em pleno voo
que ainda hoje
traz nos lábios
a minha flor de Abril



eufrázio filipe

quinta-feira, 11 de abril de 2019

EM PLENO VOO POR UM GRÃO DE AREIA







Não são únicos os caminhos

mesmo quando se cumpre
a rota dos sonhos
e os barcos se despem
de destinos por sobre as águas

Já tínhamos visto longe
a céu aberto
palavras íntegras
a respirar por guelras

pétalas a despontar nos desertos

mares a gorgear
na folhagem das escarpas
noites claras
ao som do relógio de pêndulo

Não são únicos os caminhos

mesmo quando andamos
a sibilar no vento
desapercebidos do pássaro
que renasce em pleno voo

por um grão de areia


eufrázio filipe

terça-feira, 2 de abril de 2019

VERDADES IMPROVÁVEIS (2)





Na ausência de palavras
desenhei uma flor encarnada
neste chão de marés

soltei-lhe as pétalas

cadenciadas
silvestres
musicais

agarrei o vento pelas crinas
esculpi um grão de areia
para a vida despontar num sopro de vento
e a luz se libertar
pelas fissuras da pedra

convoquei pássaros
resgatei memórias
e outros silêncios

escrevi de novo
verdades improváveis

inesperadamente
hoje não quis salvar o mundo


eufrázio filipe

(Chão de claridades)