quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

A NOSSA ROMÃ ( 9 )






Com olhos tão abertos que nem pareciam olhos de ver, à tona partimos de tão longe. Navegámos a noção de um dia chegar, nus em chama a cerzir o recorte da montanha.
Na verdade o que havia para arder já tinha ardido, mas ainda respiramos a verticalidade dos mastros tutores de árvores persistentes, o esplendor da nossa cordilheira de fragas nos mais profundos silêncios alcantilados.
Partimos à míngua da luz dos relâmpagos indomáveis, muito antes das palavras se debruçarem na vertigem dos sonhos, muito antes de construirmos um barco para voar. Partimos à pergunta - não de um conflito de estrelas nos céus,
mas de estrelas estateladas no chão.
Nós sabíamos que por vezes a realidade ultrapassa a ficção, só não sabíamos que perante uma discreta sonata de pássaros silvestres, no pomar da romãzeira, o Dique ladrava mais alto, quase humano, como se fosse um cão - e tu passeavas indiferente.


 

25 comentários:

Rogério G.V. Pereira disse...

Versos
com sabor vincado
frutado
de romã
a debruçarem-se na "vertigem dos sonhos"

Armando Sena disse...

Embora conscientes da realidade, sempre buscamos a ficção.
É sempre melhor um mundo menos real, mais poético.
Um bom 2014.

Sónia M. disse...

Difícil ficar indiferente, seja ao ladrar quase humano do Dique, ou à discreta sonata dos pássaros silvestres, quando se tem olhos tão abertos, que não parecem olhos de ver. Lindo!

Beijo

Sónia

Lídia Borges disse...


A "partida" é uma ideia emigrante a tanger o abandono a que vai sendo votado, o pomar.

Um beijo

Ana Tapadas disse...

O texto é muito belo...o pomar está abandonado...

bj

Vento disse...

uma guerra de estrelas no chão do pomar da romanzeira..., que imagem linda, Eufrázio.

beijo.

jrd disse...

Por vezes, quando a realidade ultrapassa a ficção, até o Dique sente que romã(sed) pode ser desamor.

Flor de Jasmim disse...

Belíssimo como tudo o que escreve.

Um bom ano para p meu amigo e todos os que lhe são queridos.

beijinho e uma flor

Anónimo disse...

Belo!

Beijo.

manuela barroso disse...

Um trilhar de caminhos que não trilha almas...ao som dos poemas falados! Divino!
beijo!

Laura Santos disse...

Quando encontramos as estrelas estateladas no chão significa que a paisagem e os homens e as mulheres que a habitam sofreram horrores.
Um texto soberbo, como sempre.
xx

Suzete Brainer disse...

O poeta das metáforas,nos

proporciona viajar no curso

do sentir,vestido pela

beleza exuberante das

palavras com asas,que

nos permite tirar

os pés do chão...

vida entre margens disse...

É na transcendência de nós, que se atinge a verticalidade...
Assim foi desde os primórdios...

Abraço e Bom Ano!

Que a romãzeira floresça e dê fruto...:)

Silenciosamente ouvindo... disse...

É realmente um trilhar de caminhos...
Espero que possamos trilhar caminhos
diferentes em 2014.
Bj.
Irene Alves

Graça Pires disse...

Muito belo! É sempre um gosto enorme lê-lo.
Um abraço.

Laura Ferreira disse...

gostei destes olhos.
bom ano,

Teresa Poças disse...

Fabuloso! Não conhecia este blog mas fiquei fã. É tão bom quando temos alguém com quem possamos construir "um barco para voar"!
bom ano

ana disse...

Não creio que haja indiferença perante um cenário destes. Pode haver divagação, momentos instantâneos de ausência... por vezes é preciso.
Boa semana!:))

Manuel Veiga disse...

romãs com fogo por dentro...
a arder como círios ou corpos inflamados.

belo

Abraço, Poeta.

Graça Sampaio disse...

Muito bonito! O texto e a cada uma das palavras. Escolhidas a agulha de chochet. Sempre com o marulhar das águas por trás. E nós tentado manter-nos à tona...

Licínia Quitério disse...

Lindo este teu teatro de personagens quase fantásticos.

Olinda Melo disse...


A Romã! What else? E faz todo o sentido. Símbolo do amor e da fecundidade,com ela vemos aqui germinar ideias do passado e do presente, deste chão de metáforas que nos interpreta. Até o Dique...

Abraço

Olinda

Rita Freitas disse...

E muitas vezes não sabemos quando é realidade ou ficção, até ouvirmos o canto dos pássaros.

Belo

Abr

Canto da Boca disse...

Quase sempre sabemos do ponto de partida, mas quase nunca do que se encontrará no percurso, e muito menos no final dele....

manuela baptista disse...

o Dique, era como se fosse um homem