Conduzia na estrada do Barranco do Bebedouro - serpenteada,estreita,iluminada pela lua cheia.
De repente um vulto na minha rota. Não pude evitar. Só o vi pelo retrovisor.
Ao contrário do que se diz, as fotografias não substituem as palavras, mas esta sangrou-me.
Saí do carro e ajoelhei-me junto do animal- um rafeiro alentejano, lindo, que ainda me olhou nos olhos e disse baixinho
- É pá - mataste um cão livre.
A lua cheia derramava-se, inundava o silêncio de cores pálidas e eu levei-o ao colo.
Quando chegámos a casa só pude fazer o que fiz.
Chamei o Dique e pedi-lhe para convocar todos os cães da aldeia. O funeral foi marcado para a meia noite.
Todos compareceram.
Solidários quatro amigos mais corajosos ofereceram-se para escavar a terra, num canto da horta, onde espontâneas medram as hortelãs.
Todos reunidos no mais profundo silêncio, quando um uivo comovido despoletou um choro colectivo.
Só o Dique não chorou. Trazia na boca uma papoila que largou na sepultura.
Eufrázio Filipe
"Caçador de relâmpagos"
Que belo texto! Adorei! ;)
ResponderEliminarBeijo e uma excelente semana.
Um texto muito belo que me comoveu.
ResponderEliminarUm beijinho.
Ailime
"Só o Dique não chorou"
ResponderEliminarE lá fiquei eu a pensar, quantas vezes serei dique, um dique cheio de água, no limiar de transbordar, mas sustenho as lágrimas, e me socorro das metáforas, quase sempre de palavras, para elaborar afetos.
Mas é mais libertador quando me junto ao uivo.
(Duas partes igualmente genuínas)
Excelente, poeta, excelente!
ResponderEliminarÉ sempre bom passar por aqui.
Abraço.
Que dizer de um texto destes? Fiquei sem palavras.
ResponderEliminarAbraço
Toda a tua sensibilidade expressa neste magnífico texto poético.
ResponderEliminarUma boa semana, meu Amigo.
Um beijo.
Gosto!
ResponderEliminar=)
Bjinhos
o Dique está a perder qualidades - as flores são para os vivos!
ResponderEliminaros mortos dispensam-nas!
abraço
ResponderEliminarA intimidade faz-se na estrada
da vida, imprevistamente, com um pá.
Nem uma reza um gajo faz, basta
uma papoila em seu natural.
Vermelha, pá!
Abraço.
Que sensibilidade! Eu choraria de igual modo... :(
ResponderEliminar"Caçador de relâmpagos" - o título não podia ser mais adequado ao conteúdo que tenho lido por aqui.
ResponderEliminarBjinho
Uma beleza.
ResponderEliminarUm mago das palavras que as faz brilhar como as as edtrelas mais poderosas.
Abracinho
Lindo e comovente.Adoro cães e esta história é mais um comprovativo de como temos ainda muito que aprender com o comportamento dos animais...! Um abraço.
ResponderEliminarUma homenagem perfeita a quem nos deixa... E no silêncio fica tudo dito...
ResponderEliminarBeijos e abraços
Marta
Um texto lindíssimo! Sem mais palavras para o descrever
ResponderEliminarUm texto inesquecível.
ResponderEliminarUm abraço do longe
Amor cão
ResponderEliminarquero eu dizer, compaixão
Caro Poeta
ResponderEliminarLevei por empréstimo este excelente trabalho poético.
Espero que não se importe.
Saudaçoes Poéticas
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