Antes de chegar às galerias, identificaram-me com um sorriso.
Subi no magnífico elevador, conduzido por um delicado polícia.
Sentei-me nas galerias e olhei para baixo. Lá estavam os representantes da nação. Os eleitos da república. As palavras cruzadas, as ideias esgrimidas, as bandeiras nas lapelas, os passos perdidos, os aparelhos políticos. Os credos e os farsantes. Desiguais.
Inocente segredei a um jovem cabisbaixo, companheiro de galeria:
Coisa linda esta democracia.
Lá em baixo também estavam os meus, pouco numerosos ainda mas a combaterem pela maioria que vive nos subúrbios de tudo.
Lá em baixo quase todos esquecidos de subir os olhos para as galerias, tricotavam a verve, gesticulavam poses de verniz.
De quando em vez disparavam blasfémias, partilhavam impropérios para mais tarde se abraçarem à hora do repasto.
Inocente o jovem cabisbaixo segredou-me:
Comigo um dia isto vai ser diferente.
Terminada a sessão plenária os deputados sairam como estava previsto. O amplo salão ficou vazio e solene. De tantas memórias.
O salão ficou vazio mas deixei-me ficar até ser convidado, pelo mesmo delicado polícia.
Foi um dia que resolvi festejar em silêncio.
Procurei um restaurante no belo bairro de São Bento e sentei-me à mesa.
Serviram-me o intragável discurso do primeiro-ministro, em diferido.
Os ácidos bem convergiram, mas não foram eficazes para digerir o falacioso paraíso.
Fechei os olhos, abri os olhos e pedi o livro de reclamações, onde escrevi:
O que me serviram está fora do prazo. Quando chega a nossa vez?
Levantei-me da mesa sem pagar. Os empregados ficaram a ler o meu protesto.
Lá fora ouvi alguns aplausos, mas fiquei na dúvida quanto ao seu voto.
Dei uma volta ao quarteirão e na passagem ainda olhei para a fachada do palácio.
Larguei um viva à república, à liberdade e ao 25 de Abril.
Para meu espanto a porta rangeu. Começou a abrir-se lentamente.
Era a senhora da limpeza.
"Um dia isto vai ser diferente"....pois quero acreditar que sim.
ResponderEliminarPara já um grande ano para si
Abraço
Disse-te uma vez e te repito
ResponderEliminarNão era nada a mulher da limpeza
Julguei que já sabias...
Era a própria República
Convertida em "mulher-a-dias"
(este teu texto é um documento histórico)
Espectacular! E que inicio de ano, com esta força. Adorei. A escrita não a porcaria do estado da nação, mais a corja de vermes de gravata e discurso fácil, de volta do moribundo (povo) na casa que devia ser a mais ilustre da nação (assembleia)Beijinho. Bom Ano! Boa semana.
ResponderEliminarSeja a Senhora da Limpeza, seja a República, seja a Padeira de Aljubarrota, seja quem for, as verdades e as revoltas começam muitas vezes nas palavras e nos gestos das mulheres :)
ResponderEliminarFeliz Ano Novo!
Mar Arável,
ResponderEliminarQue intensidade emana do seu texto:
alguma tristeza? - Como o entendo.
Beijinho e Bom Ano!
Saudações poéticas!
ResponderEliminarMeu caro:
O mundo não acabou... como previam os sábios Maias...
Por isso lhe desejo um ainda melhor, este novo ano para 2013.
:)
ResponderEliminarFELIZ AÑO Y FELIZ VIDA.
Un abrazo grande.
mar
ResponderEliminarAtentos...
ouviremos
veremos e lemos
e resistiremos porque não podemos ignorar.
Um abraço e um Bom Ano
Feliz 2013!
ResponderEliminarApesar de...
Beijinhos*
magnifico!
ResponderEliminarbeijo.
Pelos vistos a senhora da limpeza chegou atrasada!
ResponderEliminarAbraço
ResponderEliminarUma limpeza a fundo, faz falta. Há fungos apodrecidos por todo o lado.
Gosto deste modo de dizer!...
Um beijo
Venha ela, a limpeza!
ResponderEliminarIsto tem mesmo que deixar de ser assim...
Abraço.
Parabéns! Um texto que diz tudo!
ResponderEliminarPrecisamos de uma urgente limpeza.
beijinho
Mar eu acredito que só haverá limpeza quando decidirem alterar a maneira como somos representados. Os partidos políticos não defendem o povo e só querem ser eleitos para terem benefícios. Depois de eleitos esquecem tudo e só tentando defender os seus interesses. Excelente texto
ResponderEliminarDurante décadas os portugueses elegeram sempre os maiores e melhores profissionais da "limpeza"... de dinheiro... foi cá uma "limpeza" ;)
ResponderEliminarSão tão bons que até conseguem "limpar" a senhora da limpeza...
Bjos
obrigada!
ResponderEliminarbom ano.
beij
Há que ter fé que aos poucos desapareçam os livros de reclamação.
ResponderEliminarUm beijinho
neste novo ano desejo o melhor do mundo e...
ResponderEliminarNovo Ano
Nova Vida
Nova Esperança...
Novo Recomeçar...
E neste Ano
Eu quero
Nova vida
Nova Esperança
Novo Renascer...
um beijo (espero um melhor 2013... o 2012 cansou-me muito...)
"De quando em vez disparavam blasfémias, partilhavam impropérios para mais tarde se abraçarem à hora do repasto."
ResponderEliminarCorja!!!
Que texto magnífico! Pena a realidade que lhe dá vida...
Um excelente ano para si, Eufrázio.
Faço meus os seu votos: Viva a República, a Liberdade e o 25 de abril! :)
ResponderEliminarUm texto espetacular e apropriado...Gostei mesmo. BS
ResponderEliminareh eh
ResponderEliminargostei gostei.
Caro amigo,
ResponderEliminarJá li este texto-poema várias vezes.
Tão genial que não sei dizer. Encantou-me a reclamação e deixe que lhe diga, com esses vivas fortes à república, à liberdade e ao 25 de Abril só poderia aparecer a senhora da limpeza...
Beijos
Branca
Bonita, bonita era a imagem da República, meio espantada, meio curiosa... Boa fotografia mesmo!
ResponderEliminarDe resto, façamos Vivas à república e ao 25 de Abril, enquanto pudermos...
Abraço e bom ano!
Uma excelente estória de sentidos cruzados, meias-metáforas, desejos e esperanças! Retrato do nosso tempo...
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ResponderEliminarExcelente reflexão, Mar Arável, sobre os nossos representantes e a própria democracia.
Um Bom Ano Novo.
Abraço
Olinda
Perfeito! Visualizei todas as cenas, o almoço acre, uma figadeira estragada, até a senhora da limpeza, com a bata às três pancadas e os salários em atraso.
ResponderEliminarCá por mim, varria-os, aspirava-os, deslocava-os para ... a Madeira, em dia de temporal? Até é vergonhoso estarem num sítio tão significativo, tão belo e serem (a maioria) um bando de ladrões da democracia.
Bom Ano, boa verve, boa luta!
Não são todos iguais, tal como não são todas iguais as senhoras da limpeza! Mas que isto está a precisar de uma limpeza, lá isso está!
ResponderEliminarUm abraço de quem acredita nas vassouras desde que não sejam voadoras
Meu querido Poeta
ResponderEliminarInfelizmente uma reflexão muito verdadeira sobre o estado a que isto chegou...a sujidade impera e precisamos mesmo de uma limpeza profunda.
Um beijinho
Sonhadora
que viva a República - limpa! e que venha o dia claro...
ResponderEliminarexcelente guião cinematogratico - assim o cinema viva!
abraço, meu amigo e meu irmão.
Deliciei-me, Mar Arável, deliciei-me!
ResponderEliminarO meu abraço!
Feliz año... te regalo las palabras de este abrazo.
ResponderEliminarCaro E., o meu voto e aplauso também se lhe dirigem veementemente. E junto os meus "vivas" aos seus.
ResponderEliminarUm abraço.
Deixo-te um beijo e votos de boa semana! Um Abraço, para compor e proteger do frio. :)
ResponderEliminarmuito bem....
ResponderEliminarfará uma limpeza daquelas....
boa semana.
beijo
Excelente texto. Sabe eu acho que em Portugal não há uma cultura politica. Daí que se o prato que se apresenta na mesa de eleições não presta, as alternativas são igualmente duvidosas. O povo tem a sensação de que todas as discussões são só para português ver, fora da Assembleia são todos amigos. Por outro lado, o próprio povo que clama todos os dias, que vai a manifestações várias, etc, na hora de votar vai para a praia, para as férias, ou sei lá para onde. Ir às mesas em massa mostrar a sua força e decidir o seu futuro é que não. Depois levam os 4 anos em oposição e dizendo que não votaram neles. Pois não. Nem neles nem nos outros.
ResponderEliminarUm abraço e que 2013 não seja tão mau quanto esperamos.
Olá! Tens um prémio (presente) no meu blog. Se não ligares a essas coisas não fico aborrecida, mas se achares de o trazer deixo-te aqui o aviso. Beijo grande, obrigada pelas ruas visitas e carinho. Boa semana!
ResponderEliminarQue Portugal precisa de uma limpeza, precisa..
ResponderEliminarBjs.
tenho por certo que já não vai lá com os métodos tradicionais.
ResponderEliminarmas também acredito que para cada veneno existe sempre um antídoto...
no caso, uma vassourada nestes "ninhos de poupa" (leia-se "merdosos")
excelente, como sempre, Eufrázio
fraterno abraço
Mel
Será que a Senhora da limpeza já não tem forças para limpar, em profundidade, todo o bolor contagiante que por lá grassa?
ResponderEliminarAbracinho meu!
Gostei deste texto!
ResponderEliminarUm abraço.
Simplesmente Fabuloso.
ResponderEliminarViva a República, a Liberdade e o 25 de Abril!
É preciso fé pra poder sonhar...
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