sexta-feira, 11 de maio de 2012

CHOREI COM OS CÃES



                                                     Publicado no meu "caçador de relâmpagos"




Conduzia na estrada do Barranco do Bebedouro - serpenteada, estreita, iluminada pela lua cheia.
De repente, um vulto na minha rota. Não pude evitar. Só o vi pelo retrovisor.
Saí do carro e ajoelhei-me junto do animal, um rafeiro alentejano, lindo, que ainda me olhou nos olhos e disse baixinho:
- É pá, mataste um cão sem dono.
A lua cheia inundava o silêncio e eu levei-o ao colo para dentro do carro.
Quando cheguei a casa, só pude fazer o que fiz.
Chamei o Dique e encarreguei-o de convocar todos os cães da aldeia. O funeral foi marcado para a meia noite.
Todos compareceram.
Solidários, quatro amigos mais corajosos ofereceram-se para cavar a sepultura, num canto da horta, onde espontâneas medravam hortelãs.
Todos reunidos no silêncio.
Um uivo comovido despoletou um choro colectivo.
Só o Dique não chorou. Trazia na boca uma papoila que largou
em cima da sepultura.


40 comentários:

  1. Eufrázio, porra. Não vale. Eu venho aqui para ler a sua poesia e fico com uma lágrima no canto do olha. Está bem, pronto, sei que sou maricas mas escrever tão bem assim sobre um caso que pode até ser real, é demais. Você é o máximo. Um abraço.

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  2. Tenho chorado é sozinha,
    sem os cães
    nem os cães entristeço

    Abraço!

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  3. Há mortes sem culpa que são sentidas
    como se todos a tivéssemos

    (Tenho livro e, inexplicavelmente, senti este escrito como se me repetisses a dor, mas mais intensamente)

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  4. E pra que explicar? Não precisa. São nossas as lágrimas e são nossos os sentimentos e as perdas.

    bjs nossos

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  5. Senti vontade de ouvir o Zeca cantar aquela parte da canção que diz "e não há quem lhe queira valer".
    Emocionante meu caro.
    Abraço

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  6. E quem não chorou pela perda de um animalzinho de estimação? Muito delicada a sua crônica.
    Abraços Poéticos!

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  7. Tão belo...

    Gostava de o colocar em " o pó da escrita"...será pedir demais?


    Bj,
    maria

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  8. eu já tinha lido este texto.
    e aconteceu-me o mesmo de quando o li da outra vez.
    as lágrimas sabem (sempre) a sal.

    um beij

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  9. Comoveste-me. Tu e o Dique!
    Só quem fala com os cães é capaz de chorar com eles.
    Abraço

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  10. Quando a prosa nos dá a mais bela poesia, está tudo dito.
    LINDO!

    beijinhos

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  11. Toda e qualquer palavra se faz excessiva, às vezes.
    Fico presa a um certo silêncio, não sei de conforto, se de inquietação.

    L.B.

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  12. só o Dique não chorou [ou ninguém viu...]!
    este é um poema muito especial, um relâmpago.
    beijo.

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  13. Frágil a sensibilidade dos poetas.
    E do Dique com papoila. A união por causas nobres faz a força.caro poeta.

    abraço,

    Véu de Maya

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  14. não chorou,

    porque todos os cães ganham o céu sem dono

    um abraço

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  15. Texto emocionante, Mar arável.Só quem compreende os animais chora com eles, meu amigo, e deixou aqui um mar de lágrimas.

    Bom fim de semana.

    Abraço

    Olinda

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  16. Lindo o seu texto.
    De uma ternura para além do tempo

    Nem tenho palavras para enaltecer o cão que morreu e o cão que lhe colocou a flor - sem chorar...

    Belo!...

    Maria luísa

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  17. "... amanhãs com memórias..." :)

    uma papoila onde medravam hortelãs...
    que poema belo, Mar.

    beijo.

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  18. O texto é comovente, deixa um nó na garganta.
    Há lágrimas que não se vêem...
    Um abraço e boa semana.

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  19. Lindo este poema, provoca lagrimas de tristeza mas também de esperança, por saber que ainda existem pessoas a tratar os animais com dignidade.
    Obrigado

    Beijinhos

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  20. Não chorou, o Dique. Chorei eu por ele.
    Felizmete nunca me aconteceu, mas já vi muitos anormais atropelaram animais e seguir ... alguns aparentemente contentes.


    Amigo Eufrázio,
    Vou estar ausente. Não estranhe.
    Volto logo.
    Beijo

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  21. ...se amemória não me falha, já tinha lido este texto.
    E...tocou-me, na simplicidade descritiva...e, nesse olhar humano.

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  22. Esta história comoveu-me, sabe? Mas saio daqui com a alma lavada pela sensibilidade das suas palavras.

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  23. Afinal, só mesmo o Dique é que não chorou...parece que todos quantos aqui entraram ouviram esse mesmo uivo comovido e se juntaram às lágrimas...

    Beijo
    Sónia

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  24. O Dique acredita que, agora sim, o cão sem dono, alcançou a liberdade.
    Beijito.

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  25. Em tempo de luto e fragilidades, um pouco da minha tristeza irá para o cão sem dono. O teu texto é belo e pungente.

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  26. Estou certa que esta delicada narrativa exprime o sentir e a experiência de muitos. Inibo-me de a adjectivar, as minhas palavras seriam certamente reducionistas.

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  27. Poeta

    Não tenho palavras...chove-me no olhar.
    Sublime.

    Beijinho
    Sonhadora

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  28. Espero teu verso.
    confesso.

    bj

    http://cozinhadosvurdons.blogspot.com.br/2012/05/cozinha-convida-combata-o-crime-de-odio.html

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  29. Se a memória não me atraiçoa, trata-se da reposição de um texto poético. Em todo o caso, adorei relê-lo dada a sua magnificiente qualidade. Gostei muito meu caro amigo poeta.
    Abraço.

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  30. O Dique chorou por dentro... a lágrima, uma papoila.

    Magnifico!
    beijinho
    cvb

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  31. Muito comovente este texto. Só quem
    não goste de animais poderá ser
    insensível ao mesmo.
    Um bj.
    Irene Alves

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  32. Abriram-se as cancelas celestes onde poderá ser astro farejador, condutor do poema. Brilhante.

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  33. Muito sentido.
    A papoila caiu no silêncio que a escrita desperta.
    Parabéns!

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  34. É muitas vezes a dor silenciosa a mais comovente. Uma papoila vermelha é como uma lágrima de sangue.

    Beijos

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