domingo, 31 de julho de 2011

NEM TODOS OS CÃES SÃO DE BARRO (3)


                                                     reconstruído do meu CAÇADOR DE RELÂMPAGOS"

... enquanto aquele anjo permanecer nas areias, bem pode o vento soprar.

- O cão ou o velho?

Lentos, trôpegos, com os pés a tracejarem  caminhos de sempre, todos os dias aquelas almas percorriam memórias.
O cão mais velho que o dono  - era o guia, a sua bengala de cego. 
Pela orla da praia, desde a gruta onde viviam até à colossal duna, abrupta sobre as águas, as aves marinhas mergulhavam a pique - esbracejavam asas só para os salpicar - e eles lá iam , serenos, livres, sem palavras - imensos.
No ar cálido, o sussurro dos silêncios embalava-lhes os passos num concerto de maresias.

Chegados ao topo da montanha, era sempre assim. O velho afagava as orelhas do cão e o cão lambia-lhe as mãos.

Sentados nas areias respiravam infinitos - o perfume das algas. Adormeciam por instantes para logo despertarem o voo das aves. 

Ao longe, muito ao longe, inesperadamente, alguém de um barco bramou 

- Fuja - a duna vai desmoronar-se

Impertubável respondeu baixinho - para não acordar o cão

- A duna sou eu?



35 comentários:

  1. e o sono de um cão não deve ser perturbado...

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  2. "as árvores morrem de pé..." - como alguns homens. no uivo de um cão!

    abraço, caro Poeta.

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  3. Acho que já te tinha dito
    que acho este teu texto
    muito bonito

    (ou talvez o tivesse dito baixinho-para não acordar o cão...)

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  4. Texto lindo e de uma cumplicidade comovente.

    Beijo

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  5. Mar Arável,
    A duna se se desmoronar vai ter ao mar e lavar as suas areias.
    O cão dorme porque sabe que vai com o seu amigo...

    Um texto muito interessante!
    Beijo.

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  6. Haverá, talvez, para cada um de nós, o dia de ser duna.


    Um abraço

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  7. Adorei o blog. Adorei sua escrita. Parabéns! Quero convidar vc a dar uma passada no meu blog: http://raissasofia.zip.net
    Abraços

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  8. Nada como ter um amigo que nos acompanhe para onde quer vamos.
    A tua história é serena, livre, quase não precisa de palavras, pois é feita de sentimentos.
    GOSTEI!

    Beijos.

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  9. ...que exista sempre o sopro das (tuas) palavras...

    Beijinho*

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  10. A idade não perdoa!... E há dunas de valor imenso na imensidão dos afectos que a idade não perturba nem neles interfere!... Há sempre barcos a passar ao longe... das dunas e do cão por quem olhos afectuosos olham. Gratos!...




    Abraço

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  11. O vento sopra, o tempo passa, o homem perece lentamente, com dignididade.

    Texto com enorme carga emotiva.

    Um abraço
    oa.s

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  12. Todos podemos ser uma duna ou um cão. Depende do modo como perspectivamos a vida...

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  13. Textos que nem precisam de comentários, estão no ponto, servem para ser saboreados em silêncio.

    Bjos

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  14. Gostei. Gostei dos cheiros que senti, das cores que construí, dos olhos cegos e da dormência do cão, da duna macia e do silêncio a desmoronar-se.

    Gostei da metáfora.

    Beijo

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  15. A mútua presença afrontava qualquer desafio... "Sentados nas areias respiravam infinitos" e desmoronar seria "apenas" mais uma viagem... a dois (a um?!...)
    Abraço
    Quicas

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  16. Imensos são os caminhos em que homens e os cães percorrem as hastes do tempo e deixam na areia a sua pegada respeitosa.

    Destes textos, que respiram infinitos, se distendem, acrescentados, os meus olhos.

    Abraço daqui, Eufrázio, boas férias, se for o caso.
    Mel

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  17. Não apenas recheado de belezas e ensinamentos, mas o conto é muito comovente!
    Tenho cá para mim que falta-nos essa sensibilidade e fidelidade, encontrada nos cães.

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  18. O tempo é infinito, ele, não nós.
    Desmoronamo-nos em cada grão-minuto.

    Fica o amor e o bem que fizemos bem.
    Abç da bettips

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  19. Gosto do teu tom, sempre azul, sempre céu (ou será o(a)mar?!).
    Abraços poéticos!

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  20. tão lindo o teu conto, Mar.

    permite-me transcrever o que mais me emocionou...

    "... as aves marinhas mergulhavam a pique - esbracejavam asas só para os salpicar - e eles lá iam , serenos, livres, sem palavras - imensos...

    ...Chegados ao topo da montanha, era sempre assim. O velho afagava as orelhas do cão e o cão lambia-lhe as mãos.

    ...Sentados nas areias respiravam infinitos - o perfume das algas. Adormeciam por instantes para logo despertarem o voo das aves.

    ... - A duna sou eu? "

    beijo, Mar.

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  21. Navegando por estes mares em expectativa...atràs do fim do conto. Será que o velho se desmoronou ou sobreviveu? Será que o cão acordou e salvou o dono?

    Beijos meu amigo fiel.

    Parti, mas não por aqui.

    Branca

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  22. Só queria dizer que gostei muito, tocaram-me aquelas figuras, aquele cão que vou imaginando noutras situações, para não falar já do velho, do sábio velho...Ele é que sabe!
    Abraço!

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  23. O tempo é um aliado as circunstâncias.

    beijos carinhosos!

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  24. Meu Anjo..
    Agora, neste momento,
    onde quer que esteja,
    sinta o coração tranqüilo,
    a alma leve, a mente junto da luz.
    Sinta neste momento, o ar que te rodeia,
    a vida que pulsa perfeita em você.
    Não se descuide nunca!!!!
    Dê sempre a você, o melhor...
    aceitando a transformação dos tempos,
    aprendendo que a cada dia,
    muito está reservado para a você.
    Então, seja feliz agora..
    Seus lindos Sonhos realizados.
    Um final de semana lindo e abençoado.
    Sua Amizade Para Mim é Tudo.
    Bjs,,Evanir,,

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  25. Todas as dunas desmoronarão um dia, mas nem todas terão consigo um afago cúmplice no momento da queda.

    Um abraço, Eufrázio
    os meus parabéns, pela excelência do seu texto.

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  26. Meu caro amigo Eufrázio;
    Sublime texto.
    Parabéns.
    Um abraço.

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  27. Excelente. Um quadro de ruína com gente dentro. E o cão, claro, que nem todos são de barro.
    Abraço, Eufrázio.

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  28. Mar,

    " A duna sou eu?"


    Que maravilha esta paz de espírito e a reflexão que o conto nos leva. Obrigada.


    Beijos com carinho.

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