quarta-feira, 26 de maio de 2010

OS DIAS CONTADOS PELOS DEDOS



Parecia que a chuva estava cansada
de cair neste chão
muito antes de rebentar a sombra
das videiras

mas de tanto azul
no outro lado da serra
ainda há mar bastante
mais que céu
para as aves circularem livres
nas nossas mãos 

Cúmplices sabíamos que a água
não caía dos teus olhos 
nem dos meus 
nem do rumor das fontes 
nem dos céus vertiginosos 

tão só 
caía 

Sabíamos que um dia ía chover
na escarpa onde nos despimos
sem esquinas nem becos

só não sabíamos os acordes 
das maresias 
para merecermos os nossos lábios 
os dias contados pelos dedos 

31 comentários:

  1. Há acordes que nunca se sabem, que se criam, que se perdem, que se buscam e que se descobrem. Belíssimo!

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  2. Gosto sempre dos teus poemas, mas deste gostei ainda mais.

    Um abraço, amigo.

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  3. cheira a mar...sendo campestre...
    Belo com dimensão telúrica da tua encosta.

    Abraço,

    Véu de Maya

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  4. [como preces para os cursos da natureza, que se desfaz e recompõe nas próprias palavras]

    um imenso abraço

    Leonardo B.

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  5. memória de encontros amorosos, de uma sede a que nunca faltou a água que "tão só/ caía". belo!

    abraço.

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  6. Palavras para quê se já está tudo dito?
    Abraço

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  7. quando contávamos os dias
    nos rumores das marés
    para prevenir o fro dos Invernos
    ainda não sabiamos que as aves
    circulam sempre
    ainda que as nossas mãos antecipem
    a rebentação das sombras.

    só mais tarde soubémos que o mar
    é o destino de céus vertiginosos.

    _

    beijos Eufrázio

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  8. "muito antes de rebentar a sombra
    das videiras" - bonito isto. É quando a linguagem se esquece de dizer alguma coisa, e faz só poesia.

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  9. No teu dom de poemar
    Só te quero dizer que estive por aqui... a ler-te.
    :))

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  10. Há chuvas que chegam de céus que o próprio céu desconhece...

    Gostei muito deste poema, mas na verdade... gosto de todos os poemas "aráveis"...

    Abraço

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  11. Conto pelos dedos o tempo de entardecer cansaços. E chegou-me aqui o cheiro da maresia e a magia das palavras.
    Um belo poema!
    Um beijo, amigo.

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  12. Lindíssimo. Doce-amargo, com uma linha azul a circundar os lábios, os dedos...

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  13. "Cúmplices sabíamos que a água
    não caía dos teus olhos
    nem dos meus
    " versos para um delicado encontro

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  14. Por vezes a vida nos leva a contar os dias pelos dedos !!!

    bjs

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  15. momentos que assim contados são mais bonitos de recordar. um beijinho, eufrázio.

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  16. E quando acabam os dedos das duas mãos? Podemos contar.... com os da alma?

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  17. Quando não sabemos os acordes
    em vão se dedilham as cordas da viola,
    os acordes que soam são imperfeitos.

    Bjos

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  18. Poema d'água...belo. Obrigada pela visita à Casa da Imaginação.

    Abraços,
    Tânia

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  19. O que me trouxe aqui foi esta frase que li no Guizo e o Gato: "Infinitésimo é o pensamento". Numa frase conseguiu dizer tudo. Fantástico.
    Gostei do seu poema e do nome do seu blogue. O mar, imenso mar exerceu e exerce uma atracção enorme de coragem, de medo e infinitude.
    Se me deixar colocarei o seu poema no meu blogue porque gostei, e é tão simples como isto!
    Passarei para saber se autoriza.
    Desculpe entrar sem bater à porta.
    :)

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  20. Segui o curso de água dos teus versos - cheguei ao fim dos dias.

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  21. E correm rios e marés e nós, caravelas sem mastro..

    Um abraço

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  22. Como os comentários já vão longe fico-me por um: gostei!


    :)))

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  23. Contar pelos dedos ou... confiar que, depois da chuva, teremos a sombra das videiras.

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  24. gosto dessa metáfora do tempo incrustado no corpo...lind!

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  25. É a palavra, a palavra que, sempre maior, se entre_laça na sombra das videiras em pousio, germinativa, néctar, canto, hino.

    Belíssimo.

    Grata pela partilha
    Mel

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  26. Chegar... partir
    Regressar ao ninho
    Pé ante pé...
    Escutar contigo
    o mesmo búzio
    Falar com os mesmos cães
    na tua escarpa
    "para evitar
    o suicídio"
    para lá dos silêncios.

    princesa

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