quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

O APEADEIRO DA BEMPOSTA

 




Parti numa folha de papel por mares desnavegados, vales, rios e montes. Sem mapas nem estrêlas a despertar azinhagas e amoras silvestres. 
Foi assim que tropecei numa aldeia - casas dispersas, outras geminadas, um café, uma taberna, uma capela, um pelourinho e um apeadeiro de caminho de ferro.
Uma aldeia linda, afagada por canaviais, chorões e o cantarolar de um riacho onde corriam em paz águas cristalinas. 
O Café Moderno, no largo do pelourinho exibia um jogo de matraquilhos, seis mesas e um rádio antigo em voz alta. 
- Como se chama a vossa aldeia? 
- Bemposta. Diz a lenda que uma senhora real, muito bem vestida e triste, visitava aqui um aldeão. Chegava de charrete e partia, nua e sorridente. 
O Alexandre é que sabe explicar estas coisas. Deve estar no apeadeiro. 

No apeadeiro encontrei o Alexandre - um velho sentado num banco em frente  à linha do comboio. 

- Velho não, jovem com muita experiência.
Aprendi que a vida tem muitos apeadeiros mas aqui fiquei eternamente livre com uma mulher no coração. Uma santa mulher que me ensinava a contar pelos dedos todos os silêncios e a cantar baixinho para não acordar os pássaros. Uma santa mulher, mais linda que a Bemposta. 
Nunca por aqui passou. Foi eu que a inventei. 
Na memória essencial sou caçador de relâmpagos e o amigo que faz na vida? 

- Sou artesão de metáforas. 



eufrázio filipe
texto revisitado

21 comentários:

  1. Um belíssimo artesão!
    Há duas Bempostas no meu percurso: uma não tem apeadeiro, talvez seja a outra...

    Beijo

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  2. Curioso e nostálgico o clima criado neste texto.
    Boa Noite.

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  3. Qual caçador de relâmpagos, as minhas melhores vivências também fui eu que as inventei. Ando a treinar a área das metáforas.
    Quando conseguir dominar essa Arte, poderei fundir-me numa só pessoa, tal como vi acontecer aqui.
    Caçador e artesão unidos, jamais o sonho será vencido!!

    Um abraço, Poeta Trovador.

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  4. Como bem diz a Ana, um belíssimo artesão.
    Abraço e saúde

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  5. Amei sua criatividade! E realmente faz jus à atividade que diz desenvolver. Um artesão de primeira! Abraço.

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  6. Belíssimo texto e imagem que me deliciou e tocou.
    É na verdade um excelente artesão de metáforas e contador de histórias.
    Um beijinho e obrigada por este momento.
    Ailime

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  7. Maravilhoso apiadeiro... É memórias que mesmo inventadas encantam. Beijo

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  8. Fascinada, desci no apeadeiro e fiquei a ouvir o caçador de relâmpagos.

    Beijo.

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  9. Um magnífico texto, muito criativo .
    Gostei da história, do caçador e do artesão.
    Bom fim de semana, caro Eufrázio.
    Abraço.

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  10. Dois encontros, dois mundos, duas potências e nasceu a poesia!

    :)

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  11. Esse recanto soube- a saudades . Mas o apeadeiro trouxe o fascínio das memórias secretas que dormem em cada um de nós .
    De mestre, que o é.
    E sorri🌷
    Beijinho , EF.

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  12. Dois carris e uma dúzia de solipas podem ser uma metáfora aventurosa ou escada para subir na vida. Na Bemposta.
    Eu que já viajei para cima e para baixo não o faço com mapa mas com intenção, depois de andar perdido. E aqui caí, neste mar arável, onde existe um Senhor que numa simples folha faz sempre uma circum navegação. Sempre com bons ventos. Excelente.
    Abraço.

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  13. "navegar é preciso...", nem que seja à memória.
    Boa tarde

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  14. Artesão de metáforas. Caçador de relâmpagos. És assim. E encontraste o teu chão onde o teu caderno de poeta te reconhece...
    Continua a cuidar-te, meu Amigo.
    Uma boa semana.
    Um beijo.

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  15. Adorei.
    E sim é um auténtico.
    Artesão de matáforas.
    Cuide-se
    Beijinhos
    :)

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  16. Artesão e (re)inventor de metáforas.
    Grande abraço Amigo.

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  17. Fabuloso!!
    Parabéns, senhor «artesão de metáforas»!
    Beijo.

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