domingo, 23 de novembro de 2014

RESISTE O MEU CÃO DE BARRO





A minha escarpa tem uma janela para o vento entrar de preferência com relâmpagos. 
Quando troveja inconformado abro a porta que dá para o alpendre e os "Serra da Estrêla" vertiginosos avançam amedrontados. 
Aninham-se nos tapetes da sala. 
De alma lavada e farto pêlo, entram casa adentro, sacodem-se, vivificam as paredes onde me acompanham um óleo do Kiki Lima, outro do Albino Moura, pratos alentejanos, uma falua em casca de ostra, uma estatueta da Papua Nova Guiné, o relógio de pêndulo, um poema do Eugénio de Andrade. 
Quando troveja e os céus se derramam, a minha escarpa alumia-se. Os "Serra da Estrêla" deitam-se e ressonam nos tapetes até eu pegar no sono e acordar a fazer poemas ou quase nada. Lá fora, imperturbável (e)terno a dizer coisas improváveis - o meu cão de barro - sem medos, resiste em vigília ao tempo que faz. 



23 comentários:

Olinda Melo disse...


Ah, esse cão de barro tem muito que contar! Já o conhecemos de outras vigílias, atento às ondas alterosas e ao relampejar. O seu dono, o nosso querido caçador de relâmpagos, quando faz "quase nada" quer dizer que se encontra no seu labor incessante: produzir maravilhosos textos que nos transportam a essa escarpa onde tudo acontece.

Bom domingo.

Abraço

Olinda

Agulheta disse...

Um cão atento a tudo em sua volta,mesmo sendo de barro!
Abraço amigo

Elvira Carvalho disse...

Um texto muito belo.
Um abraço e uma boa semana

Rogério G.V. Pereira disse...

O Dique
Que já não vejo há uns tempos
Faz-lhe uma festa por mim,
como agradecimento ao tanto que te inspira



Graça Sampaio disse...

Texto poeticamente belo!

Palavras soltas disse...

Aconchegante.Eu queria uma escarpa assim... Posso levar comigo para postar lá em meu blog? Aguardo sua reposta.

Beijos e obrigada.

Majo disse...

~ Uma escarpa com uma decoração e presenças amigas que bem protegem o Poeta das emoções causadas pelas intempéries.

~ ~ Só o cão de barro é insensível...

~ ~ Grata pelos deliciosos momentos de leitura. ~ ~

Manuel Veiga disse...

esse teu cão de barro, tão imperturbável e solene, mais parece um leão (salvo seja) a guardar os "portões sagrados" do parlamento...

receio que um dia possa vir a ser requisitado pela senhora Presidente - do dito.

forte abraço.

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

um cão de barro aguenta tudo
até um dia
nesse dia nem relâmpagos nem trovoes irá aguentar
beijo
:)

Ailime disse...

Uma escarpa muito acolhedora!
E lá fora o cão de barro a vigiar!
Um texto muito belo!
Beijinhos,
Ailime

Lilá(s) disse...

Esse cão de barro que tudo aguenta!
Bjs

Lídia Borges disse...


Barro é matéria frágil!...

Bj.

ana disse...

O cão de barro é intemporal.
Abraço!:))

Mar Arável disse...

LIDIA BORGES

frágil é o cristal
mais forte o seu brilho

Lídia Borges disse...

Não me ocorreu, de imediato este:

Claridades

"Os objectos movem-se
nas paredes da casa
enquanto a luz vertebrada da vela
se consome em babas de cera

porque somos frágeis como o cristal
e por vezes mais fortes que o seu brilho

Nas cabeleiras deste lume
ardem palavras de sonho

mas não as suas claridades"




Eufrázio Filipe,"Que fizeste das nossas flores"

Mar Arável disse...

Estimada poeta LIDIA
estás perdoada pelo meu cão de barro

Odete Ferreira disse...

Lendo, ocorreu-me um ermitão mas com a sabedoria dos tempos invisíveis...
Essa escarpa é mágica e, como tal, tudo faz sentido.
Literariamente grandioso, este texto, amigo.
Bjo :)

By Me disse...

As escarpas são escorregadias e íngremes, declive perigosos... E...um raio não estilhaça o cão de barro?
Nada é eterno!

Rita Freitas disse...

Intemporal, para além do cão de barro, é também este poema.

bjs

Silenciosamente ouvindo... disse...

Pois é um cão muito especial...
Que ele se mantenha.
Um abraço
Irene Alves

Agostinho disse...

Sendo de barro o mais fraco
- o cão? - persiste na esperança
que a tempestade se desfaça.
Os raios de sol hão
de enxugar-lhe os ossos
ão ão!

Sónia Micaelo disse...

Desconfio que este cão de barro
seja um (e)terno guardião de metáforas...

Belo!


jrd disse...

(In)temporal, o Dique mantém-se vigilante e firme na defesa dos seus
irmãos "Serra da Estrela".

Abraço fraterno