segunda-feira, 11 de março de 2013

NA BOCA DAS SEMENTES



                                                                    
                                                                  Álvaro Cunhal (desenho na prisão)


A noite estava tão fria
desencantada
anoitecida
nos ramos das árvores

e os cães uivavam
para as estrêlas

Íntegros por sobre as pedras
no caminho das águas
traçávamos linhas
a carvão em folhas de papel
ousávamos transgredir
à tona dos lábios
o fulgor alumiado
dos cristais

Estava tão frio
mas nas ruas despontavam coros
centelhas de cravos
pavios
na boca das sementes
para alimento dos pássaros

 

25 comentários:

  1. Lindo, triste e muito dolorido ao ler. Ainda bem que existe um novo amanhecer para cada ser.

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  2. Apesar do frio, foi bom vir aqui colher uma centelha para acender, com ela, o verde que pode esmorecer, mas não morrer.


    Um beijo

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  3. Os cravos são vermelhos como o teu coração-Poeta.

    Abraço,

    Véu de Maya

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  4. ...e na noite fria, centenas de milhares de pavios iluminaram e deram voz às bocas sedentas de sementes, que ainda não germinaram...ou murcharam?...

    Esperemos que pássaros inquietos, impacientes e ansiosos de justiça, renovem a sementeira!
    Que a colheita seja farta e de boa qualidade.

    Um abraço!

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  5. Nas margens, o calor da fusão.
    Cristais, quartzo, feldspato.
    Projectos em linhas e a semente do 25 de Abril.
    Quem espera sempre alcança...
    Vermelho de sangue e Verde de seiva.
    E viva,viva o sonho esperado da Liberdade!

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  6. Quão grande é 'ousar transgredir' e poder vislumbrar centelhas ...

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  7. Belíssimo, com a esperança e a força que nos deixas nas palavras e com o exemplo de persistência e resistência de um grande Homem, que fazia desenhos na escuridão da sela, a caminho dos cravos e da luz de Abril.

    Ideais que hão-de voltar.

    Beijos

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  8. O frio da noite que nos assola bem merece ser cortado com estas "centelhas de cravos" que iluminam cada vez com mais força.
    Tenhamos esperança.
    Beijinho. :)

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  9. Genial o seu poema com um significado enorme! Os cravos vão florir de novo, porque continuam desenhados(gravados) na alma do povo. Beijinhos Ailime

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  10. Ler,sentir,reflectir.
    Gostei do desenho do Álvaro Cunhal.
    Que falta que ele hoje - mais do
    que nunca - faz.
    Bj.
    Irene Alves

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  11. Que nunca nos faltem transgressões e transgressores para nos alimentarem os sonhos...

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  12. Centelhas de cravos
    que um dia
    voltarão a iluminar
    o chão dos pássaros

    Beijo
    Sónia

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  13. Também escolhi um desenho de Álvaro Cunhal para o soneto que, com muita dificuldade, publiquei no blog do sapo... mesmo os menos saudosistas de entre nós lembram as sementes e as águas de Abril...

    O meu abraço, Mar Arável!

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  14. O frio não há-de ser maior do que os gritos dos cravos.

    Um abraço, Eufrázio

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  15. *
    na boca das sementes,
    residem as esperanças,
    da lezíria expectante,
    entrosando o trigo,
    no calor da papoila,
    tolerando o joio,
    no mar das searas !
    ,
    marés de luz,
    das cativas janelas,
    viradas para o mar,
    negrume no antanho,
    libertas agora,
    de um actual Peniche,
    e sempre filho Nazareno,
    deixo-te,
    para ti,
    e para o AUTOR do desenho,
    numa cela, que todos os
    Portugueses podem visitar !
    *


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  16. Poesia de que gosto! Magnífico poema. Bj Ailime

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  17. na boca das sementes
    para desassossego das sombras
    remos velas e rotas
    encontram o caminho
    no dizer de ser
    mais que as rotas
    o desígnio de marinheiros
    chamando os poetas
    com cânticos de sereias

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  18. O calor das coisas é sempre a luz impúbere na narração das ruas. É sempre, a chuva que aliás agora parou, logo a seguir à noite, onde os olhos se olham entre dois lábios ansiosos na boca.

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