No chão dos marnotos caminhamos azinhagas, comemos amoras, tropeçamos memórias, pedras, pérolas e pó - para compreendermos melhor as palavras de carne e osso até as metáforas se ajoelharem como pequenos deuses inúteis, à nossa mesa.
Só depois provamos o sal das marinhas. A safra.
O tempo dos homens que se chafurdam no moliço.
A distancia que nos atrai e separa, a pele esfarrapada para resistir aos Invernos, mastros de flores salgadas nos olhos distantes a gatinharem no tempo, até ao aborrecimento final.
Após a "botadela" a marinha começa a parir uma massa branca que envaidece os homens quando se olham
nas sombras curvas projectadas na água.
O sal aparece ao ar livre. Reunido em montículos junto aos tabuleiros das marinhas e
aí fica a escorrer as últimas lágrimas. Depois é o marnoto que enche canastras transportadas à cabeça dos moços. Depois é sempre assim. O mesmo peso até estar construído o grande cone branco.
Antes de regressarmos às azinhagas e comermos o resto das amoras, os homens reunem-se ao cair do dia, para festejar.
Enquanto se embebedam, cantam com a ajuda de uma gaita de beiços. Há sempre um que vomita e volta a cantar.
São os rudes corações de oiro, meninos triturados, construtores de marinhas valentes. São os que transformam água em pão, enquanto à nossa mesa se ajoelham as metáforas.
33 comentários:
Texto cheio de poesia e de humanidade que são, bastas vezes, uma e a mesma coisa.
Abraço.
quem disse que o "neorealismo" não é literatura, enganou-se mil vezes...
"invejo" o texto. soberano.
abraços
obrigado
obrigado
OBRIGADO!
.
é o cântico Maior
dos meus olhos
.
e regresso
"de flores salgadas nos olhos"
______
um beijo
de iodo
e sal
Magnífico! Difícil explicar toda intensidade ao ler.
Obrigada.Beijinho*
É preciso entender as diferentes vidas de uma vida insertas num quotidiano sofrido de mil maneiras.
Algumas oportunidades são poucas. Conheci há muitos anos o trabalho das salinas e nunca o esqueci ainda que ninguém meu tivesse lá andado. Há coisas que não esquecem.
Abraço
´Valentia!Ainda haverá gente assim???
um bjo
Belo texto! E como o senti nas entranhas!!!
Neta de um marnoto, salinas do Mondego, faina do sal, mulheres que correm, cestos á cabeça...elas que são ou eram o outro lado do marnoto... palavra que já poucos conhecem...
Vizinha do maravista.
Apareça!
um texto salgadíssimo de verdade.
gostei muito.
beijo
Soberbo!
O sal da vida
o suor de tantos...
Soberbo!
Beijo
Muito bommmm!
:)))
Para além da poética, para além da escrita no seu todo,a imagens que perpassam, o ritmo.. tudo.
Lindo.
Bj.
Sal, suor e lágrimas...
Abraço
Magnífico texto!
O sustento de tantos
arrancado do suor do sal...com alegria!
Beijo
Trabalho duro e acre, descrito com palavras doces,encharcadas em ternura!
Quando cheguei ao fim quis mais e mais!
Recordações, somente boas recordações me levou este texto. Voltei a cerca de 5 anos atrás... quando trabalhei em Rio Maior e um levantamento de Costumes e tradições fiz onde inclui as salinas de Rio Maior. Que nos dias de hoje, serem as palavras, as frases a darem nos alegria!Obrigada!
De Soeiro a Redol o lugar das tuas palavras e da minha admiração.
Um grande abraço
Mar Arável,
Vim deixar-lhe algumas emoções e levar outras...
Um abraço carinhoso, na companhia de um sorriso :)
direi, textualmente poético...
o
en
canto
da
voz
do
povo
en
quanto
nós
des
construímos
as
metáforas
belíssimo
.
um beijo
Vim até aqui levado por uma frase tua que me cativou, algures, e vou radiante pois encontrei um texto cheio de matizes de bom gosto literário mas que deixa cicatrizes no leitor. Bonito e duro, ainda que real. Assim é a nossa terra.
Reconhecido
Um texto muito bom!
As imagens assaltam-nos, impressionantes na sua beleza real, carregadas de sentido poético inesgotável.
Um bom fim-de-semana :)
a poesia do sal.
um beijo.
sua poesia deu uma bela prosa.As marinhas salgam o mar para adoçar a vida.
Vim retribuir a visita e gostei muito do que aqui li.
Um abraço e bom domingo
E ainda há quem «pense» que o sal da vida vem das prateleiras dos hipermercados, sinais de um tempo que devia pedir desculpa ao tempo... o Sal da Vida vem das mãos daqueles cuja vida não tem pitada de... Sal!!!
são os gestos no trabalho que golem a natureza
" São os que transformam água em pão, enquanto à nossa mesa se ajoelham as metáforas."
.
é.
o lugar desta água de sal.
purificador.
beijo.
Bjo e boa semana!
Uma prosa poética, que retrata os
"construtores de marinhas"
" São os que transformam água em pão"...
Palavras que encheram este coração de saudade de um menino do rio... ( o meu pai)!
Abraço.
Lindo texto !
um dia de labor bém descrito,
sentido..
beijinhos
Extraordinário! Bela descrição poéticamente realista. O sal entra-me no corpo...
Bj
O lugar do sal. Onde o trabalho dói e greta mãos e pés. Um belo poema, aqui. Um abraço.
"São os rudes corações de oiro, meninos triturados, construtores de marinhas valentes"
Belíssimo, Mar arável !
(Pena é que se deixe morrer este património ... o ouro branco)
um beijo de sal
iv
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